Enquadramento

O enquadramento de uma fotografia é fundamental para a construção de seu sentido. Ele depende do espaço, do tempo e do intuito da fotografia.

O enquadramento de uma fotografia é fundamental para a construção de seu sentido. Ele depende do espaço, do tempo e do intuito da fotografia.

Em um parquinho infantil de uma praça, na lateral de um brinquedo há um jogo da velha com peças interativas em verde, roxas e vermelho. Quando o X está virado para a frente, a peça está sem alterações, mas caso seja o círculo, rostos com diversas emoções estão desenhados, como emojis. Na disposição em que a fotografia foi tirada, aparece um rosto feliz, um mandando beijo e com chifres, um bravo e um chateado.
A. f/8, V. 1/160s, I. 400 | Lívia Gariglio

Como escolher sobre o que fotografar em um espaço? Essa é uma dúvida bastante frequente entre os fotógrafos. A decisão de algo aparecer ou não, e até mesmo a forma como aparece impacta na leitura da fotografia. Dessa forma, ao usar o enquadramento intencionalmente é possível criar uma narrativa interessante ou mudar o significado da imagem. Mas, como essas escolhas são feitas? E quais são os fatores que influenciam? Neste capítulo, iremos nos aprofundar nessa temática.

Como o tempo e o espaço afetam o enquadramento?

Em cima de uma mesa de madeira, existem dois ambientes diferentes: um espaço limpo e vazio, com um abajur de luz vermelha o iluminando e um espaço que é iluminado de azul e entulhado com diversos objetos, como garrafa d’água, carregador, blusa, bolsas, pincéis, moedas, entre outros. Existe um contraste visual entre os dois lados.
A. f/5, V. 1/60 s, I. 800 | Lívia Gariglio

Imagine que você resolva fotografar a sua sombra quando está andando pela rua. O seu corpo não deixa de existir por você fotografar apenas a sua sombra, não é mesmo? Isso mostra que existem elementos de um espaço que nem sempre vão aparecer no enquadramento da fotografia, ou seja, no visor da câmera. O que aparece no visor é o campo de visão e, aquilo que não aparece no visor é o extracampo, ou fora de campo.

Isso significa que podemos mostrar ou não mostrar algo. Por exemplo, é possível tirar uma foto em que um quarto parece arrumado, mas na realidade apenas aquele fragmento está organizado e o restante, está extremamente caótico. Isso seria um exemplo de mostrar ou não-mostrar algo, escolhendo aquilo que está em campo e fora de campo. Ou seja, mostrar algo é incluir no campo e não mostrar é tirar do campo.

Mas, e se eu tiver algo no campo, mas que eu não quero que apareça? Nesse caso, não o evidencio. Existem algumas formas de se evidenciar ou não algo que está em campo. Vamos pensar em uma mancha na parede, por exemplo. Nessa situação, poderíamos desfocar o fundo ou  posicionar outro objeto que esteja no campo para ficar a sua frente. Assim, estaríamos evidenciando esse objeto, não a mancha.

Desse modo, estamos escolhendo recortes tanto ao mostrar ou não mostrar  (escolher o que entra em campo e o que fica fora dele), quanto ao evidenciar ou não evidenciar (definir a forma como algo aparece no campo).  Esses recortes podem ser de espaço ou de tempo. Todos os exemplos citados até agora foram de espaço, ou seja, escolha de como abordar o lugar onde a fotografia está sendo tirada. Entretanto, a fotografia também depende do fator tempo para acontecer.

Um abajur com estampa clara e sustentação de metal escuro está na frente de uma parede branca que contém uma mancha alaranjada.
A. f/3.5, V. 1/30 s, I. 100 | Lívia Gariglio

Segundo Maurício Lissovsky (2008), a fotografia é uma máquina de esperar, ou seja, é como se tivéssemos que nos visualizar como uma espécie de videntes. Se você quer tirar uma foto de alguém sorrindo espontaneamente, você imagina que acontecerá alguma ação que vai gerar esse sorriso. E só depois disso, irá tirar a fotografia. Mas, e se isso não acontecer? São situações que nem sempre se concretizam e o recorte de tempo impacta diretamente no resultado de uma fotografia.

Pessoas sentadas e em pé aguardando em um ponto de ônibus. Carros estão parados na rua, no trânsito. Atrás, estão casas e o céu, que está azul com nuvens rosas, indicando o fim da tarde.
A. f/4.5, V. 1/125 s, I. 1600| Lívia Gariglio

Para ilustrar isso, decidi tirar uma foto de um ponto de ônibus em horário de pico. Dei preferência aos bairros que eu frequento por morar perto e, portanto, achei que teria mais facilidade. No entanto, eu estava completamente enganada. No primeiro dia, começou a chover e voltei para casa antes de conseguir fotografar. No segundo, cheguei por volta de 16h40min, para conseguir capturar o movimento que começa a partir das 17h. Entretanto, no local escolhido, as pessoas estavam esperando o transporte público na praça que fica atrás e não exatamente no ponto. Então, fui para a  rua de cima, porém, cheguei exatamente no momento em que dois ônibus estavam passando e, assim, o ponto ficou bem mais vazio. Esperei uns 20 minutos e não estava circulando tanta gente, por isso me desloquei para um ponto que ficava mais para a frente. E, nesse momento, percebi que o meu maior obstáculo consistia em fotografar do outro lado da rua, mesmo com o grande trânsito de carros e caminhões. A fotografia acima foi o resultado, depois de diversas tentativas.

Além disso, o mesmo espaço, em horários diferentes, pode proporcionar uma sensação e uma interpretação completamente diferentes. Isso pode acontecer por causa da iluminação, das ações que ocorrem, entre outros. Uma praça, durante o dia pode passar a sensação de vivacidade, movimento e jovialidade e de noite, pode parecer deserta, triste e decadente.

O enquadramento é estético, ético e político

Essa escolha de recortes espaciais e temporais são feitos com base em três critérios: estético, ético, e político. Quando a intenção é provocar alguma sensação ou experiência, o critério é estético. Já se o foco é, por exemplo, não mostrar o rosto de uma criança em vulnerabilidade, o recorte é feito com propósito ético, e se for relacionado com expor uma realidade, um conteúdo crítico ou opiniões e posicionamentos, o recorte é político.

Dessa forma, o enquadramento é utilizar o campo e o extracampo para construir uma narrativa por meio do tempo e do espaço, com base em intuitos estéticos, éticos e/ou políticos. Nenhuma fotografia é isenta de enquadramento, mas dominando essas formas de mostrar e esconder, de imaginar e esperar, é possível produzir fotografias ainda mais intencionais, criativas e únicas.

Referências consultadas na produção deste conteúdo

ENTLER, R. O corte fotográfico e a representação do tempo pela imagem fixa. Studium, Campinas, SP, n. 18, p. 30–42, 2019. DOI: 10.20396/studium.v0i18.11788. Disponível em: https://econtents.bc.unicamp.br/inpec/index.php/studium/article/view/11788. Acesso em: 20 abr. 2023.

FLÁVIO VALLE. Enquadramento. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em: <https://culturafotograficaufop.blogspot.com/2016/09/glossariofotografico-enquadramento.html>. Publicado em: 16 set. 2016. Acessado em: 20 abr. 2023.

LISSOVSKY, Mauricio. A máquina de esperar: origem e estética da fotografia moderna. Rio de Janeiro: Maud X, 2008.

Como citar esse conteúdo

Marc Riboud

Fotógrafo que registrou cenas cotidianas de países que estavam em guerra

Fotógrafo que registrou cenas cotidianas de países que estavam em guerra

O fotógrafo Marc Riboud nasceu em Lyon, na França, em 1923. Advindo de uma família burguesa, formou-se em engenharia e trabalhou em uma fábrica em sua cidade natal. Em 1951, o jovem de 23 anos tirou uma semana de férias com o objetivo de fotografar as cenas ao seu redor, com a câmera Kodak Vest Pocket, presente de seu pai em 1937. Como sua paixão pela fotografia era tão grande, nunca mais voltou para o trabalho, resolvido a fotografar o mundo. 

A imagem mostra as costas de quatro pessoas andando em uma rua, sendo uma delas uma mulher. Um dos homens carrega um violoncelo nos ombros, ele é o que se encontra mais atrás, na frente, um dos outros homem abraça a mulher.
Marc Riboud

Riboud fotografou suas primeiras imagens quando tinha apenas 14 anos, em 1937, na Exposição Universal de Paris. Já em 1953, estava atuando como fotógrafo oficial na agência Magnum — inclusive, chegando a ser presidente — foi nesse mesmo local  que, anos antes, ele aprendeu técnicas de fotografia com os mestres da Robert Capa, David Seymour e Henri Cartier-Bresson. 

Riboud se eternizou como fotógrafo quando, entre 1955 a 1985, viajou pela Ásia, pelo Oriente Médio e pela África fotografando não só as atrocidades da guerra e a degradação de culturas reprimidas, mas também momentos de delicadezas e de beleza presentes no cotidiano. Suas imagens eram retratos da sensibilidade onde o ser humano funcionava como objeto central.

A imagem mostra pessoas comendo, aparentemente, em um restaurante. O foco da câmera está fixado em duas pessoas específicas, as duas usam boinas, blusas de manga comprida e óculos redondos, elas comem em tigelas usando hashis, talheres típicos da ásia.
Marc Riboud
A imagem mostra três crianças asiáticas, duas delas segurando revólveres, elas posam para a fotografia. Uma das crianças encosta o revólver para a cabeça da outra.
Marc Riboud
A imagem mostra o perfil de uma mulher negra vestindo roupas típicas de seu país, sobreposto a ela, a fotografias de outras pessoas dançando que trajam roupas de salão.
Marc Riboud
A imagem mostra um casal se beijando embaixo de uma ponte, a alguns passos deles há um rio com barcos ancorados em sua orla.
Marc Riboud
A imagem mostra uma menina de cabelos curtos segurando uma flor perto de seu rosto, ela se posiciona de frente para uma fileira de homens armados e fardados.
Marc Riboud

Links, Referências e Créditos

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PAES, Nathália. Marc Riboud. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em:<https://culturafotografica.com.br/marc-riboud/>. Publicado em: 30 de maio de 2023. Acessado em: [informar data].

A cultura popular por Márcio Vasconcelos

Márcio Vasconcelos é um fotógrafo autodidata e independente brasileiro.

Márcio Vasconcelos é um fotógrafo autodidata e independente brasileiro.

Natural de São Luiz, Bahia, Márcio, através de suas fotografias, revela um olhar voltado para a antropologia e questões sociais. Há mais de vinte anos registra a cultura popular e religiosa afro descendentes brasileiras.

A fotografia mostra Márcio Vasconcelos. Ele é um homem que aparenta ter cerca de 50 anos de idade. Ele usa uma bermuda e uma camiseta de cores claras e está sentado em uma cadeira dentro de uma casa com paredes de tijolos e barro.
Márcio Vasconcelos

Grande parte de suas fotografias possui um caráter imersivo. Por meio dos movimentos que o fotógrafo destaca em suas composições presentes em algumas séries, principalmente as voltadas a retratar a cultura popular, sinto uma espécie de conexão, visto que os movimentos presentes na fotografia me levam a refletir sobre os desdobramentos do que é registrado.

Além disso, através dos elementos que o fotógrafo entrega na composição final, ele cria uma narrativa de misticidade, símbolos religiosos, cores vivas, sombras, luz, e texturas são elementos de protagonismo em suas fotografias, e são o que guiam a imaginação para o  local do fantasioso. 

Márcio, por interesse nas músicas e danças características das celebrações ocorridas em terreiros, tenta passar o som através da imagem, como revela em entrevista realizada pelo programa Olhar Indiscreto do grupo de jornalismo da PUC TV. 

Muitas de suas fotografias exploram também o cenário do sertão. No projeto “Na Trilha do Cangaço” ele registra pelas estradas famílias sertanejas enquanto resgata a história de Lampião. Márcio, por meio das imagens que captura conta a história de um lugar cheio de riquezas naturais e culturais, exalta seu povo e sua região desestigmatizando visões e narrativas de um povo sofredor, em seus trabalhos multi-premiados ele mostra um nordeste de força e garra. 

A fotografia mostra a parte inferior de duas mulheres. Elas estão usando vestidos vermelhos e chinelos. Entre elas há uma vela acesa sobre azulejos que formam o sinal de uma cruz.
Márcio Vasconcelos
A fotografia mostra um gato andando sobre um chão pintado com um desenho de uma estrela.
Márcio Vasconcelos
Em primeiro plano a fotografia em preto e branco mostra um homem negro com a parte superior do corpo em movimento. Ele usa um turbante branco.
Márcio Vasconcelos

#galeria é uma coluna de caráter informativo, com periodicidade semanal. É publicada toda terça-feira pela manhã. Trata-se de uma série de postagens que apresenta um recorte da obra de uma fotógrafa ou fotógrafo de relevância artística, cultural, estética, histórica, política, social ou técnica, acompanhadas por uma breve biografia sua. Quer conhecer melhor a coluna #galeria? É só seguir este link.

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SILVA, Vinícius. A cultura popular por Márcio Vasconcelos. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em:<https://culturafotografica.com.br/a-cultura-popular-por-marcio-vasconcelos/>. Publicado em: 23 de maio de 2023. Acessado em: [informar data].

A Prisão da Alma

Quando uma fotografia expressa a simbologia do condicionamento feminino às grades da coerção patriarcal.

Quando uma fotografia expressa a simbologia do condicionamento feminino às grades da coerção patriarcal.

Lola Álvarez Bravo foi um dos grandes nomes da fotografia mexicana do século XX, sendo a primeira mulher a sair pelas ruas com uma câmera, capturando momentos importantes da pós-revolução mexicana e evidenciando questões sociais que marcaram sua trajetória. Entretanto, também é possível notar em algumas de suas fotografias, janelas para sua própria realidade onde o machismo se manifesta em suas mais diferentes versões.

Imagem, em preto e branco, mostrando uma mulher apoiada na janela, olhando seu exterior.
Lola Álvarez Bravo

Um desses casos é a fotografia “Em Sua Própria Cela”. Seguindo sua estética marcada pelo P&B, a imagem evidencia o busto de uma mulher escorado em uma janela alta. Seu olhar distante pode ser interpretado como uma fuga subliminar do espaço geográfico que ocupa, marcado pela sobreposição de sombras que remetem às grades de uma prisão. Datada em um México de 1950, o ato de ser mulher cabia apenas dentro das suas próprias casas construídas sob uma sociedade patriarcal. 

Todavia, essa fotografia é capaz de carregar uma interpretação que, assim como eu vejo, poderia ser vista por outras mulheres em diferentes lugares do mundo. Tenho para mim que tornar-se mulher é universal. Compreende tantos significados compartilhados que tornam-se incalculáveis. Entre eles, o aprisionamento a partir de um patriarcado que, além de condicionar o corpo, também condiciona a alma.

Se partimos para o sociólogo Michel Foucault, o ser humano pode ser compreendido como “corpo” e “alma”, sendo esta não uma representação divina, mas o resultado dos poderes (sociais, econômicos, políticos e culturais) que estão ligados intrinsecamente ao corpo. Portanto, para ele: “a alma, prisão do corpo” (1975) ou seja, aquilo que interfere na “alma”, no inconsciente do ser humano é aquilo que condiciona também o corpo, sendo impossível modificar as estruturas de um homem ou uma mulher com ações apenas físicas. 

Dentro do patriarcado vigente em grande parte do mundo, percebo que esse modelo de coerção social contra as mulheres atinge seu objetivo de interferir na alma. Seus métodos não se limitam a violências físicas, mas também a violências verbais, econômicas e principalmente estruturais. A partir da fotografia analisada, compreendo aquelas referências às grades como o aprisionamento do próprio inconsciente feminino. Junto a isso, a representação da janela aberta apenas enfatiza que, mesmo livre para sair daquele local, as sombras das grades que aprisionam sua mente também aprisionam o seu corpo.

Ser mulher não está condicionado apenas pelas violências sofridas historicamente, mas para entender sua existência e a partir disso lutar, é necessário entender o machismo estrutural. A partir disso, chego a uma das conclusões possíveis de que, a fim de subverter esses discursos coercivos, é necessário revolucionar a alma. É necessário se desintoxicar de compreensões que aprisionam a mente. Assim, teremos  a liberdade do corpo.

O sufrágio feminino surge do inconsciente individual para atingir o consciente coletivo. Ir contra o patriarcado que violenta não apenas mulheres, mas toda a humanidade, é o caminho para isso. A mulher fotografada por Lola, apesar de estar situada por trás das grades da alma, tem um olhar de viajante. Esses olhos utópicos miram a liberdade que tem sido conquistada as passos curtos e importantes pelos movimentos feministas. 

Links, Referências e Créditos

  • FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. 12ª edição. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2021.

Como citar este artigo

GANDRA, Nikolle. A Prisão da Alma. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em:<https://culturafotografica.com.br/a-prisao-da-alma/>. Publicado em: 18 de maio de 2023. Acessado em: [informar data].

Cindy Sherman

Fotógrafa e diretora de cinema norte-americana conhecida mundialmente por representar personas em seus autorretratos

Fotógrafa e diretora de cinema norte-americana conhecida mundialmente por representar personas em seus autorretratos

Nascida em New Jersey, no ano de 1954, Cindy Sherman tinha uma perspectiva de trabalho que muito se assemelhava ao pós-modernismo. Ela retratava principalmente artes conceituais, produzindo imagens concentradas especialmente em iluminação, cores e expressões faciais.

Foto em preto e branca de Cindy Sherman. Ela olha para a foto e apoia a cabeça em seu braço esquerdo. A fotógrafa tem um cabelo comprido e loiro escuro, e usa uma maquiagem neutra e discreta.
Cindy Sherman

Cindy explora muito da subjetividade do espectador, deixando um espaço para que ele reflita sobre a realidade criada e montada por ela. A fotógrafa se auto retrata incorporando vários estereótipos femininos, partindo de seu próprio corpo, ela cria narrativas e faz relações visuais, comportamentais e sociais acerca dos papéis desempenhados pelas mulheres na sociedade contemporânea.

Mulher deitada no chão. Ela veste uma blusa laranja e uma saia quadriculada no mesmo tom. A imagem é toda composta por tons alaranjados, inclusive a maquiagem da modelo (Cindy Sherman).
Cindy Sherman
Mulher deitada em um sofá enquanto olha fixamente para um telefone de gancho. Ela veste um vestido rosa, de mangas bufantes, tem o cabelo curto e amarronzado. Além disso, sua expressão facial revela uma certa preocupação.
Cindy Sherman
Palhaça com maquiagem característica. Ela usa um cabelo cacheado rosa e seus olhos verdes destacam-se na foto.
Cindy Sherman

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Como citar este artigo

Soares, Maria Clara. Gioconda Rizzo. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em:<https://culturafotografica.com.br/cindy-sherman/>. Publicado em: 16 de maio de 2023. Acessado em: [informar data].

Tudo torna-se político

A fotografia em regimes ditatoriais fascistas

A fotografia em regimes ditatoriais fascistas

Nem tudo é político, porém tudo pode se tornar político a depender da narrativa e do cenário no qual está inserido. A foto abaixo é de autoria de Álvaro Hoppe, um artista famoso por sua série de fotografias da capital chilena, Santiago, tiradas na década de 1980.

A fotografia em preto e branco mostra uma placa de trânsito da cidade de Santiago na qual está escrito: “Não virar à esquerda". Além desta há outras duas placas com nomes de ruas da capital chilena.

Álvaro Hoppe, 1982

A imagem acima, sem narrativa ou contextualização, nada mais é que uma foto de uma placa sinalizando o sentido da rua. Entretanto, dentro dum regime ditatorial de extrema direita a frase “Não virar a esquerda” ganha teor político.

Nesse período, mais especificamente entre 1973 a 1990, o Chile era conduzido por um governo totalitário, comandado pelo general Augusto Pinochet, após a deposição do então presidente Salvador Allende.

Dentre as diversas imagens produzidas por Hoppe na capital chilena, algumas são bastante literais, mostrando os constantes embates entre os apoiadores e opositores do governo. Por outro lado, algumas das imagens, como a acima, são um tanto mais sutis, sendo as minhas favoritas, dentre toda a narrativa fotográfica de Álvaro Hoppe.

Nem tudo é político, uma placa de trânsito, um folheto rasgado, um muro pintado podem ser apenas elementos do dia a dia. Mesmo não deixando de ser comuns, estes podem se tornar políticos quando inseridos em cenários e ambientes onde a política não é uma opção, mas sim algo imposto à sociedade.

Deixo algumas das imagens mais “sutis” de Hoppe, imagens que, não sabendo a história, podem não ser inteiramente compreendidas pelo público.

 
A fotografia em preto e branco mostra um folheto rasgado no chão, nele se pode ler as palavras “donde están?" (onde estão?).

Álvaro Hoppe, 1980

No lado direito da fotografia em preto e branco há um muro no qual pode-se ver uma pichação com a palavra “unidade e” e um punho cerrado, não é possível ver a continuação da frase. Do lado esquerdo vemos um homem vestindo uma camisa branca e com a face coberta pelas mãos e um pano, como se esse secasse suor ou lágrimas do rosto.

Álvaro Hoppe, 1983

A fotografia em preto e branco mostra um grande muro no qual há pintada a palavra “YO”, “EU” em tradução para o portugues. A frente do muro há um garoto de costas para a câmera o que dá ao leitor uma maior noção de perspectiva acerca do tamanho da pintura no muro.

Álvaro Hoppe, 1983

 

#leitura é uma coluna de caráter crítico. Trata-se de uma série de análises de imagens fotográficas de relevância artística, cultural, estética, histórica, política, social ou técnica. Nela, a autora ou o autor da postagem compartilha com os leitores a sua leitura acerca da obra abordada. Quer conhecer melhor a coluna #leitura? É só seguir este link.

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COUTO, Sarah. Tudo torna-se político. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em:<https://culturafotografica.com.br/tudo-torna-se-politico/>. Publicado em: 11 de mai. de 2023. Acessado em: [informar data].

Luiz Alfredo e o Holocausto Brasileiro

Fotógrafo da revista “O Cruzeiro” registrou os horrores vividos pelos pacientes do Hospital Colônia de Barbacena em 1961

Fotógrafo da revista “O Cruzeiro” registrou os horrores vividos pelos pacientes do Hospital Colônia de Barbacena em 1961
Em 13 de maio de 1961, a revista “O Cruzeiro” chocava o país com a reportagem “Hospital de Barbacena: A Sucursal do Inferno” que revelava as condições insalubres em que viviam os pacientes confinados no complexo manicomial de Barbacena. Hoje, lembrado como um verdadeiro campo de concentração, palco de um holocausto, com 60 mil vítimas em Minas Gerais.
Imagem de um dos pátios do manicômio. A foto em preto e branco mostra um muro à frente de algumas árvores, alguns pacientes dispostos ao fundo estão na sombra, outros, expostos ao sol, e, à frente está um paciente, que aparenta ser uma criança, olhando para cima.
Luiz Alfredo | O Cruzeiro
O Hospital Colônia de Barbacena foi fundado em 1903 na cidade mineira – com o intuito de tratar pacientes vítimas de tuberculose. Entretanto, com o tempo, o lugar foi se tornando um local para aqueles que precisavam de ajuda psiquiátrica.
Contudo, o que se via no complexo manicomial estava longe de ser um tratamento médico. Para lá, eram enviadas, contra a própria vontade, pessoas que eram consideradas descartáveis para a sociedade. Chegavam de trem: mães solteiras, homossexuais, pobres, indígenas, inimigos políticos, mendigos, viciados em drogas, entre outros.
Vista de uma das janelas do manicômio. Entre suas grades de ferro, vemos pessoas aglomeradas num pátio tomando sol e cercadas por outras construções do complexo.
Luiz Alfredo | O Cruzeiro
Os “tratamentos” dados a essas pessoas – que na maioria nem tinham algum diagnóstico pra estar ali – variavam entre todas as possibilidades de um filme de terror, indo desde tratamentos de choque com cadeiras elétricas até camisas de força. Ainda, as condições de vidas eram as piores possíveis: expostos ao frio intenso da região muitos viviam nus, os pacientes dormiam sobre colchões de palha improvisados, passavam sede e fome e, quando eram alimentados, eram servidos de comida triturada (fator pelo qual muitos perdiam os dentes).
Imagem de uma das alas do hospital. Nela, vemos paredes envelhecidas abrigando muitos pacientes praticamente amontoados sobre as camas precárias. É possível ver alguns pacientes em pé ou sentados no chão. E, ao fundo, dois homens de terno conversando.
Luiz Alfredo | O Cruzeiro
Um paciente do Colônia está agachado numa poça d’água insalubre cuspindo esse mesmo líquido. Dando a entender que ele havia ingerido essa água. Atrás dele, está parte daconstrução do hospital e um cano que passa por essa poça.
Luiz Alfredo | O Cruzeiro
Uma criança está deitada no chão de concreto do hospital. Ela, ao contrário do que pode parecer, está dormindo e há mosquitos por todo o seu corpo.
Luiz Alfredo | O Cruzeiro
Quando “Hospital de Barbacena: A Sucursal do Inferno” – feita pelos jornalistas Luiz Alfredo e José Franco – chegou aos leitores de todo Brasil, os olhares voltaram-se para a questão dos tratamentos psiquiátricos no país, esse assunto era um grande tabu naquela época. Por isso, a reportagem extremamente denunciativa da revista é lembrada como uma grande contribuição na história da saúde brasileira e da imprensa nacional.
Com a Reforma Psiquiátrica no Brasil, o hospital Colônia de Barbacena foi mudando até se tornar o Centro Hospitalar Psiquiátrico de Barbacena e uma parte da antiga estrutura chegou a ser desativada, em 1996, e transformada no Museu da Loucura. Em 2013, a jornalista Daniela Arbex publicou o livro Holocausto Brasileiro que conta em detalhes a história do Colônia e os bastidores da reportagem do “O Cruzeiro”.
Pacientes do Colônia em seus leitos improvisados. Ao centro, temos em destaque um homem sentado em sua cama olhando para o lado com atenção. Podemos supor que ele está olhando para alguém da equipe do jornal naquele momento. Seu olhar sério rouba a atenção.

Luiz Alfredo | O Cruzeiro

 
Foto tirada em ângulo picado de crianças deitadas em berços do Colônia.

Luiz Alfredo | O Cruzeiro

 
Um funcionário raspa a cabeça de um paciente do Colônia, que nu olha para o chão. Seu corpo está curvado e ao fundo vemos mesas com pratos empilhados e uma porta aberta  com outra pessoa (possívelmente um funcionário).
Luiz Alfredo | O Cruzeiro
Uma janela com a grade de ferro está na frente de um paciente do Colônia. Essa pessoa está sentada e apoiada sobre a estrutura de ferro. Ela olha para sua mão e sorri.
Luiz Alfredo | O Cruzeiro
O cemitério do Hospital Colônia. Túmulos de concreto descuidados e envoltos por arbustos que cresceram desproporcionalmente.
Luiz Alfredo | O Cruzeiro
#galeria é uma coluna de caráter informativo, com periodicidade semanal. É publicada toda terça-feira pela manhã. Trata-se de uma série de postagens que apresenta um recorte da obra de uma fotógrafa ou fotógrafo de relevância artística, cultural, estética, histórica, política, social ou técnica, acompanhadas por uma breve biografia sua. Quer conhecer melhor a coluna #galeria? É só seguir este link.

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MAIA, Amanda. Luiz Alfredo e o Holocausto Brasileiro. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em:<https://culturafotografica.com.br/luiz-alfredo-e-o-holocausto-brasileiro/>. Publicado em: 09 de maio de 2023. Acessado em: [informar data].

Um olhar para o bem que há no mal

Como um animal se torna um símbolo

Como um animal se torna um símbolo

Lobos são ágeis, fortes, rápidos, inteligentes, de faro apurado e caçadores natos. São os animais que mais se aproximam de uma formação militar, em sua composição de alcateia, com estabelecida hierarquia entre os membros, porém, com respeito e amor. Afinal, até mesmo em esquadrões, o sentimento de família entre seus componentes está presente. Com os lupinos essa relação é ainda mais forte. 

Lobo preto olhando para a câmera num cenário congelado sarapintado de troncos de árvores congelados.
Conrad Tan

Para diferentes culturas, lobos são animais simbólicos. Nas culturas indígenas e de outros povos, e mesmo na heráldica, na mitologia e cultura popular, estes animais possuem diversos significados. Podem representar o que é sagrado, místico, ou mesmo o que é demoníaco. Não existe consenso sobre o que um lobo pode representar culturalmente; menos ainda um lobo preto, em paralelo ao racismo.

Para a ciência, o lobo preto é uma variação do lobo-cinzento; uma mutação que ocorreu ao longo dos anos, através do cruzamento entre o lobo-cinzento e cães domésticos, possivelmente de pelagem preta. E justamente por serem mutantes, são animais raros e de difícil encontro com seres-humanos. 

Para o senso-comum, lobos pretos preenchem o imaginário popular com inúmeras interpretações; nem todas positivas. Basta uma simples pesquisa na internet para observar como a agressividade, a violência, o profano e tantas outras características negativas e obscuras são associadas à cor preta, em especial, atribuídas aos animais carnívoros, que se alimentam do cadáver de outros animais para sobreviver.

Desde muito novo me entendo como uma pessoa dualista, vivendo eternos dilemas, como a mestiçagem racial. Afinal, pertencer a duas famílias, com matrizes culturais, políticas, étnicas e religiosas tão diferentes, gera a sensação de não-pertencimento total em nenhum ambiente; mesmo em casa. Nesse sentido sou tão mestiço, tão mutante quanto os lobos pretos; nem totalmente lobo, nem totalmente cão.

Para mim, lobos pretos são um guia espiritual. Enxergo neles, tudo aquilo que encanta aos olhos infantis, que restaura o imaginário que se perde na vida adulta. São exemplos de como nem toda associação à nossa imagem social são verdades absolutas. Podendo ser, simplesmente, reflexo da estupidez humana e de sua própria sede por sangue e violência, refletidas no outro pela aparência, não pela essência.

Ainda para mim, lobos representam a liderança. Diferentes dos cães, os lobos demandam a liberdade de viverem isolados, ainda que, próximos daqueles que compõem suas matrizes familiares e exércitos pessoais. Um contraste de como a nossa relação com os cães domésticos, também pode ser associada com a necessidade de liderança humana.

Os líderes mais representativos para seres humanos são os políticos que, muitas vezes, são pejorativamente chamados de lobos; como se isso fosse algo ruim. A sociedade contemporânea, está repleta de homens gananciosos, maldosos, mentalidades corruptas e bolsos cheios: a essência mais realista do que é demoníaco e violento no mundo real e que é praticada na política e não na esfera selvagem.

É com os políticos, com seus pés envoltos em sapatos lustrosos, debaixo do teto de edifícios luxuosos, em encontros secretos com pessoas que se fizeram importantes sujando as mãos de terceiros com sangue, que, justamente, se originam a maioria dos problemas sociais que o mundo enfrenta atualmente, como: a fome, a miséria, o aquecimento global, a intolerância, a ignorância, o preconceito e tantos outros.

Lupus est homo homini lupus, como dito por Thomas Hobbes, filósofo inglês do século XVII, retrata bem essa mentalidade. Mas discordo dele quando nomeia  homens como lobos na frase supracitada em latim. Eu os nomearia não como animais, mas como o que são, de fato: homens. Homini est homo homini homo, ou, o homem é o HOMEM do próprio homem, faz mais sentido perante os meus olhos. 

Políticos brasileiros têm se colocado como prioridade. Estão estrategicamente posicionados na sociedade em benefício próprio, nas posições mais seguras. Como poderiam os líderes de nossa sociedade serem chamados de lobos, se numa alcateia, a composição de uma matilha é compartilhada e coletiva pelo significado verdadeiro do que é equidade?! 

Numa alcateia os lobos mais velhos ditam o compasso da caminhada, pois são os mais frágeis. Atrás deles, os lobos mais fortes constituem a linha de frente. No meio, os lobos mais jovens e menores constituem um pelotão. E por último, o casal de lobos alfa, protege e assegura a integridade da matilha. Eles se colocam em uma posição arriscada, para o bem da matilha.

Chega a ser irônico, então, como essas associações negativas atreladas aos lobos são. Irônicas, para não serem chamadas de injustas. Lobos talvez sejam os animais com o maior significado de humanidade que tentamos tanto dar para nós mesmos, quando somos nós que possuímos o significado demoníaco de senso-comum, associado aos lobos devido a uma parcela realisticamente demoníaca da sociedade.

Links, Referências e Créditos

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BRITO, C. S. O mal que há no bem. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em: <https://culturafotografica.com.br/um-olhar-para-o-bem-que-ha-no-mal/>. Publicado em: 04 de maio de 2023. Acessado em: [informar data].

Álvaro Hoppe

Fotógrafo chileno que registrou a ditadura de Pinochet.

Fotógrafo chileno que registrou a ditadura de Pinochet.

Nascido em Santiago em julho de 1956, Álvaro Hoppe foi fundamental para o desenvolvimento da Fotografia Urbana (Street Photography) e da Fotografia Documental no Chile. Originalmente, o artista não procurou documentar conflitos, mas, após o início da Ditadura Chilena, em 1973, Hoppe produziu imagens que viriam a se tornar as mais famosas e representativas do período ditatorial no país.

A fotografia em preto e branco mostra um vidro com um buraco no meio e, por isso, está trincado. Por meio do buraco pode-se ver o busto de um policial andando na rua. Há outras pessoas na rua, porém o foco é o policial e o buraco no vidro.

Álvaro Hoppe, 1983

No início da década de 1980, com pouco mais de 20 anos,  Álvaro Hoppe começou a trabalhar como repórter no semanário “Apsi”, o principal meio de oposição ao governo de extrema direita comandado por Augusto Pinochet. As fotos de Hoppe, tiradas durante a década na capital chilena, se tornaram símbolo do movimento contra o governo que enfim cairia em 1990.

A fotografia em preto e branco mostra um folheto rasgado no chão, nele se pode ler as palavras “donde están?" (onde estão?).
Álvaro Hoppe, 1980

Enquanto algumas das fotografias são bastante literais, outras são mais implícitas. No livro Plebiscito no Chile, o jornalista Pablo Azócar escreve: “A narração de Hoppe busca obstinadamente as histórias dos muros. Os muros, a grande tela aberta da cidade”.

A fotografia em preto e branco mostra uma mulher e uma criança de costas andando na calçada, ao lado do muro da casa pela qual passam está colado um cartaz com uma chamada para uma manifestação em defesa da democracia chilena.
Álvaro Hoppe, 1983
A fotografia em preto e branco mostra dois jovens em cima de uma bicicleta. Enquanto o da frente conduz a bicicleta, o de traz lança no ar dezenas de pequenos papéis que se espalham pela rua.
Álvaro Hoppe, 1988

#galeria é uma coluna de caráter informativo. Trata-se de uma série de postagens que apresenta um recorte da obra de um_ fotógraf_ de relevância artística, cultural, estética, histórica, política, social ou técnica, acompanhadas por uma breve biografia sua. Quer conhecer melhor a coluna #galeria? É só seguir este link.

Links, Referências e Créditos

Como citar este artigo

COUTO, Sarah. Álvaro Hoppe. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em:<https://culturafotografica.com.br/alvaro-hoppe>. Publicado em: 2 de mai. de 2023. Acessado em: [informar data].

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