Passeata dos cem mil

Fotografia que retrata um importante protesto contra a ditadura militar brasileira.

A fotografia tirada por Evandro Teixeira mostra a passeata dos cem mil, uma manifestação contra a ditadura militar,  que aconteceu no Rio de Janeiro no dia vinte e seis de junho de 1968.

A fotografia é toda composta por uma multidão de manifestantes e há um cartaz e nele está escrito “abaixo a ditadura, povo no poder”.
Evandro Teixeira

No dia 28 de março de 1968, a polícia militar (PM) invadiu o restaurante universitário Calabouço, onde estudantes protestavam contra o preço das refeições. No confronto, o comandante da PM, Aloísio Raposo, matou o estudante Edson Luís com um tiro no peito. Por causa desse chocante assassinato, o movimento estudantil começou a organizar mais manifestações.

Outro cruel acontecimento que ocorreu  vinte dias depois do assassinato de Edson Luís foi a chamada “sexta- feira sangrenta”, na qual ocorreu um protesto estudantil contra o sucateamento de verbas do ensino superior da época, que  também foi movido pelo descontentamento com a repressão dos militares, a PM prendeu muitos manifestantes e matou vinte e oito pessoas.

Devido a esses acontecimentos foi marcado para o dia vinte e seis de junho de 1968 a passeata que reuniu mais de cem mil pessoas, dentre elas estavam estudantes, artistas e trabalhadores. Nesse dia, o fotógrafo Evandro Teixeira retratou o momento em que Vladimir Palmeira, líder do movimento estudantil,  fazia um discurso contra a repressão sofrida pelo governo ditatorial da época e a favor da volta da democracia brasileira.

 O mais impressionante da fotografia é a quantidade de pessoas retratadas, principalmente porque mesmo que a foto seja feita em plano aberto, toda a sua composição está preenchida pelos manifestantes, o que pode ser um indicativo da opinião popular que na época já estava farta do regime ditatorial. Esse entendimento é reforçado pelo o cartaz onde se lê “abaixo a ditadura, povo no poder”. Me emociona ver essa quantidade gigantesca de pessoas lutando pela democracia e pela liberdade de expressão.

Vivendo em um momento no qual muitos falam que a ditadura militar foi uma época boa, o registro de tantas pessoas lutando contra esse regime ditatorial é muito necessário para que fique claro o quão horrível foi esse período de repressão. Acredito que esta fotografia seja de extrema importância, pois marca o repúdio do povo aos atos hediondos da ditadura militar, além de deixar gravado na história um momento de união entre milhares de pessoas na luta pelos seus direitos. Assim, deixo aqui parte de uma canção, cantada por Geraldo Vandré, que representa o sentimento de coletividade que é essencial para continuar com a luta por nossos direitos e contra o governo atual que fere a democracia brasileira:

“Caminhando e cantando e seguindo a canção
Somos todos iguais, braços dados ou não
Nas escolas, nas ruas, campos, construções
Caminhando e cantando e seguindo a canção
Vem, vamos embora, que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora, não espera acontecer
Vem, vamos embora, que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora, não espera acontecer
Pelos campos há fome em grandes plantações
Pelas ruas marchando indecisos cordões
Ainda fazem da flor seu mais forte refrão
E acreditam nas flores vencendo o canhão”

(VANDRÉ, 1979)

#leitura é uma coluna de caráter crítico, com periodicidade semanal. É publicada toda quarta-feira pela manhã. Trata-se de uma série de críticas de imagens fotográficas de relevância artística, cultural, estética, histórica, política, social ou técnica. Nela, a autora ou o autor da postagem compartilha com os leitores a sua leitura acerca da obra abordada. Quer conhecer melhor a coluna #leitura? É só seguir este link.

Como citar esta postagem

DE PAULI, Beatriz Helena. Passeata dos cem mil.Cultura Fotográfica (blog). Disponível em:https://culturafotografica.com.br/passeata-dos-cem-mil/. Publicado em: 30/03/2022. Acessado em: [informar data].

Evandro Teixeira

Fotojornalista documentou importantes períodos da história do Brasil

Fotojornalista documentou importantes períodos da história do Brasil

Nascido na cidade de Irajuba, na Bahia, no ano de 1935, ainda muito novo, teve como professor de fotografia Teotônio Rocha, primo do diretor Glauber Rocha. Sua carreira como fotojornalista iniciou-se 1958,  no jornal Diário da Noite, onde era encarregado de fotografar casamentos que eram comentados nas páginas do periódico.

Evandro Teixeira

Em 1963, ele entra para o Jornal do Brasil, onde segue trabalhando até o ano de 2010. Sua obra possui uma pluralidade inegável, já que se destacou em vários campos relacionados à cobertura jornalística, desde temas referentes à política até fotografias de esporte. Em 1964, cobriu o golpe civil militar responsável por instaurar uma ditadura no país. Foi o único fotógrafo a ter acesso ao forte de Copacabana na madrugada do dia 1º de abril, onde registrou a chegada de Castelo Branco para seu pronunciamento e tomada de posse.

Também registrou as manifestações estudantis de 1968 e a derrubada do governo de Salvador Allende em 1973. Durante sua carreira publicou livros icônicos como “Fotojornalismo”, “Canudos 100 anos” e “68 destinos : passeata dos 100 mil”. Sua obra também foi imortalizada pelo poeta Carlos Drummond de Andrade, que dedicou a ele um dos poemas do livro “Amar se aprende amando”.

Evandro Teixeira
Evandro Teixeira
Evandro Teixeira
Evandro Teixeira

#galeria é uma coluna de caráter informativo, com periodicidade semanal. É publicada toda terça-feira pela manhã. Trata-se de uma série de postagens que apresenta um recorte da obra de uma fotógrafa ou fotógrafo de relevância artística, cultural, estética, histórica, política, social ou técnica, acompanhadas por uma breve biografia sua. Quer conhecer melhor a coluna #galeria? É só seguir este link.

Links, Referências e Créditos

Como citar esta postagem

CAVALHEIRO, Pedro Olavo Pedroso. Evandro Teixeira. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em: <https://culturafotografica.com.br/evandro-teixeira/>. Publicado em: 04 de out. de 2021. Acessado em: [informar data].

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O que é fotojornalismo?

Fotos são registros do mundo real dotados de informações visuais a respeito do que foi registrado.

Fotos são registros do mundo real dotados de informações visuais a respeito do que foi registrado. Possuem possibilidades praticamente inesgotáveis, indo de ensaios artísticos a registros de festas de casamento ou aniversários, além de momentos importantes para a história da humanidade como guerras e manifestações. As fotos registram tais eventos no momento em que eles acontecem, permitindo que possamos revisitá-los através das imagens produzidas. Mas, o que diferencia uma fotografia do cotidiano tirada despretensiosamente de um trabalho fotojornalístico?

Na imagem, policiais uniformizados, com capacetes e cassetetes fazem uma abordagem truculenta frente a um homem, no meio de uma rua e em plena luz do dia. Pessoas são vistas ao fundo, algumas assistem a cena e outras parecem correr. O homem abordado é visto no primeiro plano e cai na tentativa de fugir.
Esta fotografia de Evandro Teixeira é um dos grandes registros da ditadura militar no Brasil. Na época, opositores ao governo eram perseguidos, presos, interrogados e muitas das vezes torturados e mortos.

O professor e pesquisador Jorge Pedro Sousa (2002) escreveu muito a respeito do fotojornalismo e o define como uma atividade fotográfica em que há por fim a documentação ou a informação. Ele ainda diferencia fotojornalismo de fotodocumentarismo, sendo o tempo dedicado a cada atividade, atrelado às diferentes metodologias de trabalho, o que delimita essa diferença. Enquanto o fotodocumentarista tende a trabalhar por projeto, se dedicando por mais tempo ao tema, escolhendo métodos de elaboração e abordagem; o fotojornalista, por sua vez, lida com acontecimentos imprevistos, fatos cotidianos e ainda deve atender às demandas da empresa na qual trabalha.

Os três artistas aparecem deitados em mesas de um bar, durante a comemoração do aniversário de Vinicius de Moraes.
Nesta foto, Evandro Teixeira registrou um momento de descontração entre Chico Buarque de Hollanda, Tom Jobim e Vinícius de Moraes, grandes nomes da música, composição e literatura brasileiras, respectivamente. A ocasião tratava-se do aniversário de Morais.

Nesse sentido, Angie Biondi (2014), professora e pesquisadora, no capítulo “Fotojornalismo: um campo, uma atividade ou um objeto”, do livro “Para entender o jornalismo”, deixa demarcados dois gêneros para compreender as relações que se desenvolvem entre o fotojornalista e os fatos registrados. São eles spot news e feature photos. O primeiro se refere aos flagrantes, quando o fotojornalista presencia o fato e rapidamente precisa registrá-lo no momento em que ele se desenrola, não tendo assim muito controle sobre a foto. Já o segundo é mais aplicado às reportagens, onde as imagens produzidas servem mais como modo de “ilustrar, exemplificar ou comprovar” o ocorrido, passando por uma elaboração prévia, como explica Biondi. De certo, a ideia de feature photos parece se mesclar à de fotodocumentarismo, mas é importante lembrar que tais divisões não constituem um conceito fechado, e sim, como apontado pela própria autora, servem para “orientar o entendimento sobre a produção fotojornalística”.

Jorge Pedro Sousa (2002) coloca como questão em um de seus livros se todas as fotografias publicadas em jornais e revistas seriam de fato fotojornalísticas, e esclarece que, para ser considerada como tal, a fotografia precisa possuir valor jornalístico, ou, valor-notícia, levando informações de relevância junto ao texto que constitui. Então, não basta que a foto seja um registro de um acontecimento do cotidiano, até porque, todos os dias, milhares de eventos ocorrem em todos os cantos do mundo, e não são todos que se tornam notícia, principalmente ao se fazer delimitações de relevância, como o impacto regional, nacional ou mundial. Para que a foto seja jornalística, ela precisa possuir um caráter informativo e, em geral, estar acompanhada por uma notícia ou reportagem, uma vez que não é possível passar muitas informações importantes apenas através da linguagem visual. 

No texto “Usos Jornalísticos da Fotografia”, a autora Dulcilia Buitoni (2011), usando como referência o pesquisador espanhol Pepe Baeza, explica que, para ser considerada fotojornalística, a foto tem que ter sido planejada pelo corpo editorial da mídia na qual é veiculada, seja a imagem produzida pelos jornalistas da empresa ou comprada, diferenciando-se assim das fotografias publicitárias, que também são veiculadas por esses meios.

Um bom exemplo de fotojornalista é o baiano Evandro Teixeira, que possui trabalhos diversificados na área, tendo registrado momentos marcantes da história do Brasil a partir da década de 60. As fotografias que aparecem ao longo deste artigo são de sua autoria, sendo possível notar a variedade de temas possíveis de serem trabalhados. Como última imagem, destaco este retrato feito na comunidade Vila do João, no Rio de Janeiro, em 1988. Construído como conjunto habitacional pelo Governo Federal em 1982, a comunidade tornou-se uma das favelas que compõem o Complexo da Maré, onde questões envolvendo a violência e o crime organizado são presentes até hoje. Trata-se de uma construção do fotógrafo, com o cadáver ao fundo e um menino sorrindo à frente da câmera, sendo uma representação do contraste entre a inocência das crianças que lá vivem e a realidade que as cerca.

Um menino negro, de cabelos crespos e sem camisa sorri para a câmera em primeiro plano. Ao fundo, no chão, é possível ver o cadáver ensanguentado de um homem. Ao lado do menino, uma pessoa observa a cena com os braços cruzados, e outras são vistas fazendo o mesmo, sentadas no meio-fio da calçada do outro lado da rua
Evandro Teixeira fez um registro perturbador na comunidade Vila do João, no Rio de Janeiro, em 1988. Nela, um menino sorri para a câmera enquanto um cadáver é visto no chão ao fundo.

Assim, o fotojornalismo pode ser entendido como sobretudo, imagens produzidas a fins de registro de acontecimentos em diálogo com os critérios de noticiabilidade jornalísticos, também atendendo aos propósitos editoriais da empresa que a irá publicar. Os temas possíveis de serem trabalhados são tão diversos como as múltiplas possibilidades da vida cotidiana. Muitas vezes, algo sutil pode se transformar em um grande registro, e imagens que de início destinam-se a circulação por meio de jornais, revistas e demais meios jornalísticos podem um dia serem vistas expostas em museus ou livros próprios à memória, crítica, análise e apreciação de imagens fotográficas, destacando tanto o momento histórico congelado ali quanto as características técnicas e subjetivas trabalhadas pelo fotógrafo.

Referências: 

BIONDI, Angie. Fotojornalismo: um campo, uma atividade ou um objeto. In: LEAL, Bruno; ANTUNES, Elton; VAZ, Paulo Bernardo. Para entender o jornalismo. 1ª ed. Belo Horizonte: Editora Autêntica, 2014, p. 171-178.

SOUSA, Jorge Pedro. Fotojornalismo: Uma introdução à história, às técnicas e à linguagem da fotografia na imprensa. 1ª ed. Porto: Editora Letras Contemporâneas, 2002

BUITONI, Dulcilia. Usos Jornalísticos Da Fotografia: Informação, Ilustração. Expressão. In: Fotografia e Jornalismo: a informação pela imagem. São Paulo: Editora Saraiva, 2011
GUERRA de Tóxico – Vila do João, Rio de Janeiro RJ. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: 23 de Fev. de 2017. Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/obra28762/guerra-de-toxico-vila-do-joao-rio-de-janeiro-rj>. Acesso em: 24 de Out. de 2019.
SANTORO, Giovanna; PELLUSO, Tayana. “O pintor cria a própria arte; o fotógrafo conta com os fatos”. Portal PUC Rio Digital. Rio de Janeiro: 26 de Nov. de 2015. Disponível em: <http://puc-riodigital.com.puc-rio.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=27091&sid=55> Acesso em: 24 de Out. de 2019
FOTOS de Evandro Teixeira ao longo de 50 anos de carreira. In: O Globo. São Paulo: 24 de Set. de 2014. Disponível em: <https://oglobo.globo.com/cultura/fotos-de-evandro-teixeira-ao-longo-dos-50-anos-de-carreira-14033861> Acesso em 24 de Out. de 2019.

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