A dor de uma família em extrema pobreza

Fotografia que retrata a situação de vulnerabilidade de uma mãe e seus quatro filhos..

A imagem, tirada por Andy Goldstein, em São Paulo, é resultado de um trabalho que o fotógrafo realizou em 14 países da América Latina. Goldstein desejava captar os impactos da pobreza nas diferentes regiões.

 

Há quatro crianças sentadas em uma beliche e uma mulher encostada na cama. Eles estão em uma casa simples, de estrutura bastante precária.
Andy Goldstein

A foto mostra a doméstica Débora de Jesus da Silva, de 28 anos, e seus filhos, sentados em uma beliche humilde. A jovem mãe encontra-se escorada na cama, com um semblante pensativo e preocupado.

Ao visualizar esse cenário, reflito sobre o sofrimento dessa família. Débora, com 21 anos, teve sua primeira filha, hoje com 9. Seu bebê mais novo, com apenas 11 meses, já vive em uma realidade na qual seus direitos básicos são negados; o de brincar, de ter um sistema de saúde eficiente, uma escola e uma alimentação de qualidade. Daí surge o questionamento: como essas crianças poderão mudar essa realidade de pobreza se não recebem o devido suporte para ascender socialmente?

É por essa falta de assistência que muitas famílias continuam vivendo à margem da sociedade ao passar das gerações, porque falta apoio para essas pessoas crescerem, seja de forma econômica ou social. É aí que eu me pergunto: Cadê o governo para garantir os direitos dos cidadãos? Onde está o Estado que assegura o bem-estar da população?

É comum escutarmos um discurso meritocrático que diz “Fulano nasceu na favela, sem privilégios e hoje é um médico/jogador de futebol/juiz (ou qualquer outra profissão de prestígio social) bem-sucedido”. Discurso este que tenta isentar a culpa do abandono do governo, como se por falta de força de vontade, as outras pessoas no mesmo caso do exemplo citado não conseguissem atingir tal êxito.

Também é importante frisar que, devido à situação de vulnerabilidade, milhões de brasileiros sujeitam-se, por necessidade, a trabalhos informais que os exploram até a exaustão e, paradoxalmente, não recebem o suficiente para manter uma vida minimamente digna.

O que essa fala completamente equivocada não divulga, é que as pessoas que conseguem ascender socialmente em condições precárias, sem o devido auxílio, são exceções. Por isso, reproduzir esse tipo de discurso é problemático, porque pode gerar frustração e depreciar os indivíduos que, por falta de estrutura e suporte, não alcançam este lugar de prestígio.

Na imagem posta, me pego imaginando a dor dessa mãe ao, muitas vezes, não ter o que dar de comer a suas crianças ou a si mesma. Penso sobre sua revolta de residir em um país tão desigual, onde uns desfrutam dos melhores e mais caros alimentos, enquanto outros não têm nenhum. Em que algumas crianças têm o privilégio (que, na realidade, deveria ser garantido a todas) de só estudar e aproveitar a infância, enquanto outras têm que abandonar a escola para trabalhar em empregos informais e ajudar a família.

Até quando o Brasil terá sua renda tão mal distribuída entre os cidadãos? Até quando o país terá 24% de sua população vivendo em situação de pobreza? Sendo mulheres e negros – grupos históricamente marginalizados – a maior parte dessa revoltante porcentagem. São questionamentos que faço, mas, infelizmente, não encontro respostas.

#leitura é uma coluna de caráter crítico, com periodicidade semanal. É publicada toda quarta-feira pela manhã. Trata-se de uma série de críticas de imagens fotográficas de relevância artística, cultural, estética, histórica, política, social ou técnica. Nela, a autora ou o autor da postagem compartilha com os leitores a sua leitura acerca da obra abordada. Quer conhecer melhor a coluna #leitura? É só seguir este link.

Soares, Maria Clara. A dor de uma família em extrema pobreza. Cultura Fotográfica (blog).

Disponível em: <https://culturafotografica.com.br/a-dor-de-uma-familia-em-extrema-pobreza/>. Publicado em: 13 de out. de 2022 . Acessado em: [informar data].

Andy Goldstein

Fotógrafo conhecido mundialmente por retratar famílias latino-americanas em situação de extrema pobreza.

Nascido em Buenos Aires, Andy Goldstein – hoje com 79 anos – é um fotógrafo argentino. Sua obra mais famosa, intitulada como “Vivir en la Tierra”, conta, por meio do retrato, a vivência de famílias em condição de vulnerabilidade socioeconômica.

Andy em um cenário que aparenta ser uma galeria de fotos. Ele veste uma camisa preta e está centralizado na imagem, olhando diretamente para a câmera.
Andy Goldstein

Criado em uma família de ópticos, teve acesso ao mundo da fotografia desde criança, mas, não via o trabalho como uma profissão. Então, ingressou na faculdade de biologia, quando, por acaso, após realizar um ensaio para um amigo, ganhou visibilidade e começou a receber propostas de trabalho.

Em 1968, abriu seu primeiro estúdio fotográfico na avenida de Las Heras de Buenos Aires. Já na próxima década, Andy fundou a Escola de Fotografia Criativa, objetivando impulsionar a formação profissional que era pouco desenvolvida na cidade. Goldstein conta, em uma entrevista dada ao canal Fotógrafxs Argentinxs, sua relação de respeito com seu processo de inspiração. Quando está sem criatividade, ele afirma que concentra-se em si mesmo e foca em seu processo interno, para que consiga ter êxito no trabalho.

Menina de pele clara e cabelos loiros com a mão no nariz. Ela usa uma camisa de botão e manga longa, e encontra-se em um cenário pobre. Ao fundo, há latões e outros objetos metálicos.
Andy Goldstein
Há cinco pessoas na foto, dois homens, duas mulheres e um bebê. Aparentemente, são da mesma família, visto que se parecem fisicamente uns com os outros. Estão em cima de uma cama e em um cenário de pobreza e caos. Em torno, há várias outras camas, roupas e diversos pertences amontoados.
Andy Goldstein
Há quatro pessoas na foto, todas escoradas em uma poltrona. Encontram-se em uma casa humilde, com móveis simples e um buraco nítido no teto.
Andy Goldstein
Foto em preto e branco de uma menina em uma cozinha simples e deteriorada. Ela veste uma camisa branca, uma saia xadrez, e parece assustada. No cenário, há um fogão antigo, algumas panelas, um bujão de gás e uma mesinha.
Andy Goldstein


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Como citar esta postagem

SOARES, Maria Clara.Andy Goldstein. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em:<https://culturafotografica.com.br/andy-goldstein/>. Publicado em: 11 de out. de 2022 . Acessado em: [informar data].

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Liberdade de ser mulher

Fotografia que representa a liberdade das amarras sociais.

A autora dessa imagem, Claudia Regina, é conhecida por retratar apenas mulheres, com o pré-requisito de que as fotografias sejam feitas de forma natural e sem modificações estéticas virtuais. O motivo é a discordância de Claudia aos padrões corporais e psicológicos estabelecidos para as mulheres na sociedade. Além disso, ela acredita que a modelo fique mais confortável e à vontade em um contexto no qual sabe que sua aparência é respeitada.

Mulher gargalhando enrolada em uma cortina transparente. Aparentemente ela está nua e confortável com a exposição.
Claudia Regina
 

Sinto felicidade ao analisar esse retrato, porque, ao meu ver, ela sorri expressando confiança. Me passa a sensação de que não se importa com julgamentos alheios, que sabe se divertir sozinha e aproveitar os reais valores da vida.

Apesar de não conhecê-la, tenho admiração por essa mulher. Admiração pela leveza com que ela parece levar a vida. Admiração pela autoestima e confiança de se deixar ser fotografada nua. Admiração por esse sorriso tão sincero e singelo em um lugar no qual é tão difícil ser mulher, como o Brasil.

Quando a olho, de certo modo, me sinto convidada a gargalhar junto, pois ver o cenário em que ela está e a forma em que se encontra é acolhedor e reconfortante.

Lugar onde existe o machismo, a vulnerabilidade e a sexualização da mulher de forma potencializada. Lugar onde a mulher é vista como um objeto sexual, que deve seguir comportamentos e padrões físicos para agradar aos homens. Lugar onde a mulher tem seu corpo constantemente julgado e exposto a procedimentos estéticos para alterar o que é natural e socialmente visto como “feio”. Não é à toa que o país lidera o ranking mundial de cirurgias plásticas, sendo a lipoaspiração a mais frequente.

Por isso, a exalto pela entrega, de corpo e alma, ao momento do retrato. De certo modo, até a invejo pelo sentimento que desperta em mim: o de sentir-se autossuficiente. A impressão que tenho ao visualizar esta foto é que a modelo está extremamente contente consigo mesma, que tem consciência de seu valor como pessoa, profissional e que, como mulher, sabe reconhecer sua sensualidade. Não exclusivamente física, mas a de um ser humano empoderado, que se conhece e não tem medo de afirmar seus limites.

Além disso, a liberdade que ela aparenta é convidativa. Me faz refletir sobre os limites ou a falta deles ao longo da vida. Será que são todos realmente necessários? Será que permanecer em uma situação desconfortável é falta de limites? Até que ponto estamos nos privando da verdadeira felicidade?  São questionamentos que a imagem me faz ter. 

Espero que, no futuro, todas as mulheres, assim como a modelo, se sintam confortáveis e livres para sorrir tão verdadeiramente. 

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Claudia Regina

Fotógrafa feminista que retrata mulheres ao natural, sem modificações estéticas em manipulações de imagem.

“Quero captar a essência da mulher. E quero que ela se reconheça com alegria nessa imagem. Sem tabus”, afirma Cláudia em seu blog de fotografia: Apaixonadarte.

Suas fotos buscam representar a beleza dos diferentes tipos de corpos, cabelos e peles. Trazem diversidade e representatividade de mulheres à mídia.

Claudia Regina posicionada de perfil. Ela está maquiada e tem o cabelo raspado. Em suas costas, há uma tatuagem, aparentemente de uma árvore, que chama atenção na fotografia.
Claudia Regina

Claudia começou sua carreira editando imagens em um estúdio, mas, inicialmente, não tinha desenvolvido interesse pela arte de fotografar, era exclusivamente pelo salário. Naturalmente, esse cenário mudou e ela começou a dedicar-se ao retrato.

Hoje, dona de um site chamado “Dicas de Fotografia”, Regina dá enfoque a fotos em preto e branco e ao registro de mulheres fora do padrão estabelecido pela sociedade. Ela usa seu trabalho como uma forma de luta feminista e de oposição às amarras sociais, físicas e psicológicas que as mulheres sofrem.

Ela ressalta o quanto as mulheres são vítimas do patriarcado: são ensinadas a se vestir, a se maquiar, a se comportar, além de terem seus corpos sexualizados e desrespeitados simplesmente por serem meninas. Por isso, ela fotografa com a intenção de quebrar algumas dessas “obrigações sociais”.

Mulher sem blusa de costas para a câmera. Em suas costas há duas tatuagens: uma maior de flores e um escrito em inglês. Ela está em um ambiente que parece ser um quarto e coloca a mão no rosto como se quisesse se esconder.
Claudia Regina
Mulher sentada em um sofá com as pernas cruzadas. Ela veste uma blusa branca e está com acessórios. Seu cabelo é claro e ondulado nas pontas, e ela sorri espontaneamente para a foto, como se estivesse tendo uma crise de riso.
Claudia Regina

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O Milagre de Rose Smith

Fotografia que carrega marcas e traumas da violência das gangues.

Tirada pela fotógrafa Barbara Davidson, a imagem retrata a cena de Miracle (Milagre em português) ajudando sua mãe a se sentar na cadeira de rodas. Uma foto que poderia facilmente significar uma cena apenas de carinho, mas que traz uma história de muita luta e sofrimento.

Descrição: A foto evidencia uma criança, de aparentemente com idade por volta dos 3 anos, ajudando uma mulher a acomodar-se na cadeira de rodas. É nítido que existe uma afinidade entre as duas, visto que o processo está sendo realizado com muita cautela e carinho. Elas estão em um quarto humilde. Nele, há uma cama grande com travesseiros em cima, um ventilador no canto esquerdo e itens pessoais ao redor do ambiente.
Barbara Davidson

A fotografia foi publicada em uma matéria da agência de notícias Los Angeles Times, em 31 de Dezembro de 2010. Nela, continham informações sobre o caso de Rose Smith, a mulher da foto. Rose morava no conjunto habitacional Watts Nickerson Gardens (Los Angeles) quando teve sua mandíbula, suas costas e braços alvejados por tiros.

Smith é uma mulher inocente e, mesmo assim, sofreu as consequências da violência e criminalidade das gangues em Los Angeles. Ela nunca mais poderá andar. Triste fato que exemplifica a vulnerabilidade de muitas pessoas que moram no subúrbio. Além de ter sua própria saúde violada, a forte mulher da imagem teve de lidar com o medo de perder o ser que mais amava na vida: a bebê que carregava em seu ventre.

Rose estava grávida de três meses quando foi atingida pelos tiros. Por um milagre, a criança não sofreu traumas físicos. Esse é o motivo para o nome de Miracle. Mas, apesar da sobrevivência da bebê ter sido uma vitória, ela não ficou alheia ao mal causado pela violência. Miracle nasceu viciada no remédio que sua mãe tomava para a dor que sentia.

Olhando exclusivamente para a foto, eu sinto amor e compaixão: ver uma criança tão pequena já sabendo o que fazer para cuidar da pessoa que lhe deu a vida. Me pego refletindo o quanto elas devem ser próximas uma da outra. Mas, quando associo a imagem que vejo à história por trás, sinto tristeza e revolta. Essa mãe tem suas tarefas dificultadas devido a uma ocorrência na qual não teve responsabilidade nenhuma. Ela foi apenas a vítima.

Me traz angústia pensar no quanto as pessoas que moram nas favelas, não só em Los Angeles, mas no mundo todo, estão vulneráveis a ter seu bem estar violado. Vivem entre guerras e conflitos, dificilmente conseguem paz e descanso. O medo de “estar na hora e no local errado” assombra os moradores. Infelizmente, foi o que aconteceu com Rose, pois ela estava prestes a entrar em casa quando foi alvejada pelas costas.

É difícil não associar essa situação à criminalidade que assola grande parte dos países, dentre eles, o Brasil. O Rio de Janeiro, por exemplo – uma das metrópoles brasileiras – atingiu a marca de 100 vítimas de bala perdida em 2021, sendo 58% homens, 38% mulheres e 4% com o gênero não identificado. Entre elas, 5 crianças e 5 adolescentes. É desolador pensar na quantidade de pessoas que são feridas ou que perdem a vida todos os dias em razão de conflitos entre policiais e gangues. Pessoas que, muitas vezes, não têm conhecimento do que está acontecendo, como pode ser o caso das crianças.

Além das marcas físicas, há também as psicológicas. Famílias perdem seus parentes para a violência, crianças perdem seus direitos básicos: brincar na rua, ir à escola, ter o sono tranquilo…  Espero que, no futuro, o mundo seja um lugar mais seguro de se viver.

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Links, Referências e Créditos

SOARES, Maria Clara. O Milagre de Rose Smith. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em:<https://culturafotografica.com.br/o-milagre-de-rose-smith/>. Publicado em: 10 de ago. de 2022. Acessado em: [informar data].

Barbara Davidson

Fotógrafa que retrata mulheres e crianças atingidas pela violência das gangues em Los Angeles.

“Aprendi muito cedo a lutar contra a rejeição, a nunca desistir e nunca deixar ninguém me impedir de me tornar uma fotojornalista”. Assim declara Barbara Davidson, no ano de 2019, em sua colação de doutorado.

Nascida em Montreal, Canadá, Barbara lutou muito para ascender profissionalmente em um ramo predominantemente masculino. 

Descrição: Barbara sorrindo de forma singela, seu rosto é marcado por expressões de felicidade. Ela olha diretamente para a câmera e usa brincos popularmente conhecidos como argolas. Seu cabelo é loiro ondulado e, na parte da frente, está parcialmente preso.
Barbara Davidson

Famosa por suas imagens sobre a crise humanitária, Davidson captura principalmente fotos de guerras, da violência causada pelas gangues e dos desastres naturais. A fotógrafa ganhou bastante destaque midiático após ganhar seu primeiro Prêmio Pulitzer devido a sua cobertura do furacão Katrina. Em 2007, Barbara entrou como fotojornalista na agência de notícias Los Angeles Times, mas, dez anos depois, deixou o cargo relatando que “Era hora de me recalibrar para abrir novos caminhos”.

Segundo a profissional, a arte de fotografar é baseada em contar boas histórias e ter paixão pelo trabalho. Neste contexto, ela utilizou seu amor pela fotografia em prol de denunciar a negação dos direitos básicos, especialmente a crianças e mulheres.

Barbara Davidson
Dois meninos, de idade aparentemente próxima, em um lugar que parece ser um campo com arbustos. O menino da esquerda aponta uma arma para a cabeça do outro, que está de braços abertos e olhos fechados.
Barbara Davidson
Cinco crianças dormem amontoadas em uma cama de casal. Aparentemente desconfortáveis, em razão do pouco espaço disponível. Duas das crianças dormem curvadas para a esquerda e as outras dormem de barriga para cima com os braços levantados. Na cama também há três almofadas escuras.
Barbara Davidson

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Joan E. Biren

Fotógrafa e cineasta homossexual que lutou pelos direitos e pela visibilidade de mulheres lésbicas.

Nascida no ano de 1944, em Washington, Joan – também conhecida como JEB –  é uma profissional com uma vasta carreira acadêmica. Estudou ciência política em Massachusetts, onde realizou seu bacharelado em 1966. Anos mais tarde fez mestrado em comunicação em sua cidade natal e, após finalizar 0 doutorado em Oxford, Biren fez um curso de fotografia por correspondência e começou a trabalhar em uma loja de câmeras. Com este emprego, JEB tinha o objetivo de aprender a fotografar e retratar, com veracidade, o cotidiano de casais lésbicos.

Joan E. Biren, já com idade mais avançada e cabelos grisalhos, sentada em um ambiente que parece ser uma biblioteca e olhando um livro de fotografias. Ela está com o semblante sério e atento, o que passa a impressão de que procura alguma imagem específica.
Joan E. Biren

O interesse pela temática surgiu pela falta de representatividade de mulheres lésbicas reais nas fotografias, nos livros e filmes. Joan, como integrante da comunidade LGBTQIA+, sentia-se incomodada por não se enxergar propriamente em nenhum espaço. Com isso, começou um trabalho revolucionário: mudar o olhar da sociedade em relação às mulheres homossexuais.

A fim de atingir sua meta com êxito, Biren lançou seu primeiro livro, em 1979, nomeado: Eye to Eye: Portraits of Lesbians. Nele, foram retratadas  famílias lésbicas em sua rotina diária: os olhares apaixonados, o carinho com os filhos e os afazeres domésticos. Segundo as palavras da própria JEB, ela “tornou visível o que era invisível”. Ou seja, trouxe representatividade e acolhimento para pessoas que são colocadas à margem da sociedade.

Duas mulheres, brancas e idosas, trocando carinho. Ambas vestem roupas de frio, o que remete a ideia de viverem num lugar que tenha temperatura amena.  A mulher da direita segura o cabelo de sua parceira e tem uma expressão facial que passa a impressão de estar sentindo um cheiro doce e agradável: o de sua amada. A mulher da esquerda, já grisalha, usa uma trança e olha para sua companheira com um semblante carismático: olhar fixo e sorriso entre os dentes.
Joan E. Biren
Duas mulheres pretas deitadas e abraçadas, em um lugar que parece ser um campo. A imagem transmite a sensação de aconchego, carinho e amor, pois aparentemente este abraço é um lugar de apoio e segurança para ambas.
Joan E. Biren
Mulher parcialmente nua, com os seios amostra, cortando um pedaço de madeira com um serrote. A modelo tem o cabelo curto e encaracolado, e utiliza luvas para o trabalho braçal. A imagem transmite um sentido de revolução e empoderamento, uma vez que, embora fosse julgada negativamente, a pessoa retratada aparenta estar confortável em estar sem blusa publicamente e em realizar uma tarefa considerada “masculina”.
Joan E. Biren

JEB nunca teve apoio institucional. Em razão de sua orientação sexual, sofreu homofobia na pele: não era devidamente valorizada como pessoa e profissional, nem recebia bolsas ou prêmios. Seu trabalho era todo auto-atribuído e auto-financiado. Por isso, Joan realizava apresentações pelos Estados Unidos, nas quais mostrava suas fotos, livros e filmes. Não recebia patrocínio, mas teve o apoio financeiro da comunidade lésbica com a compra de suas obras, o que a ajudou a sobreviver.

Joan e as mulheres fotografadas se mostraram muito corajosas, pois aceitaram o risco de se expor publicamente diante de uma sociedade que era ainda mais machista e homofóbica que nos dias atuais. Afinal, na década de 70, ser identificada como lésbica poderia colocá-las em diversos riscos: perder o emprego, os filhos, ser deserdada e até deportada. Ativistas na causa como Joan trazem esperança de que, em um futuro, todas possamos ser livres e respeitadas.

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Como citar esta postagem

SOARES, Maria Clara. Joan E. Biren. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em:<https://culturafotografica.com.br/joan-e-biren/>. Publicado em: 30 de mai. de 2022. Acessado em: [informar data].

Orgulho e Paixão

Fotografia que é símbolo de luta, resistência e amor entre mulheres na década de 70.

A imagem, tirada pela fotógrafa lésbica e ativista Joan E. Biren (JEB), representa um marco: a luta por visibilidade e respeito das mulheres homossexuais. A foto foi capa do livro “Eye to Eye: Portraits of Lesbians” em uma época na qual a discriminação e o preconceito eram ainda mais acentuados que nos dias atuais.

Joan E. Biren

As mulheres da imagem são Pagã e Katie, um casal lésbico que foi fotografado por Joan. Na figura, Pagã, a senhora de cabelos curtos e escuros, segura firmemente o rosto de sua amada e olha profundamente seus olhos. Katie, a mulher posicionada na esquerda, tem o cabelo longo e grisalho, o qual está trançado em volta de seu pescoço. Ela corresponde ao olhar apaixonado de sua companheira e esboça um sorriso singelo e delicado.

A foto me faz sentir paz e tranquilidade. O olhar das modelos me remete a lembrança de quando eu admirava assim alguém que amo, com aconchego e carinho. Me pego refletindo sobre o quanto elas devem se amar. Expressar publicamente um carinho que incomoda a tantos, em uma sociedade tão preconceituosa… acredito que é um símbolo de luta e enfrentamento da opressão.

Ambas as mulheres tinham o desejo de ter seu amor fotografado e registrado, uma vez que não se enxergavam representadas em nenhum espaço. Então, Joan – que também é uma mulher lésbica que se sentia excluída socialmente – teve a ideia de criar um livro com imagens de mulheres homossexuais reais. O álbum foi intitulado como “Eye to Eye: Portraits of Lesbians” e retratava o cotidiano dos casais. Mas, por essa época se caracterizar por ser extremamente homofóbica e preconceituosa, a fotógrafa e as modelos corriam muitos riscos: desde perder a guarda dos filhos a serem deportadas do país.

Nesse contexto, o livro torna-se ainda mais lindo e emocionante para mim, porque mesmo diante do perigo, as modelos assumiram o risco em prol de validar suas existências. Ou seja, perante tanta discriminação e discurso de ódio; o respeito, o carinho e o afeto prevaleceram.

O ensaio fotográfico, feito na década de 70, segundo JEB, tinha o objetivo de mudar como a sociedade enxergava as lésbicas. Lendo este livro, me peguei refletindo se hoje – Abril de 2022 – a sociedade  teve ou não uma evolução considerável em relação àquela época. Afinal, ainda nos dias atuais, o Brasil é o país que mais mata homossexuais no mundo. Não nos sentimos livres nem para amar. Não nos sentimos livres para viver, porque temos que estar atentos para sobreviver.

Além disso, a representação do grupo LGBTQIA + é limitada. Falando estritamente do recorte lésbico, há poucos romances sáficos, por exemplo. A maior parte é clichê heteronormativo, que restringe-se a abordar a vivência de apenas uma parcela da população. Enquanto as outras, são excluídas socialmente de diversas maneiras. Filmes também são em sua maioria heterossexuais. Os poucos que abrangem a comunidade queer, trazem uma visão pejorativa, mais voltada para o sentido da libertinagem.

Por isso, ativistas como Joan E. Biren exercem um trabalho tão importante: o de promover o respeito na sociedade. Movimentos acolhedores como esse trazem esperança de um futuro livre e com muito amor.

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Como citar esta postagem

SOARES, Maria Clara. Orgulho e Paixão. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em:<https://culturafotografica.com.br/orgulho-e-paixao/>. Publicado em: 18 de mai. de 2022. Acessado em: [informar data].

Ruth Orkin

Fotógrafa e cineasta norte-americana que enfrentou obstáculos da discriminação de gênero para ascender profissionalmente.Fotografia em preto e branco em que uma mulher de cabelo curto e escuro está sorrindo, segurando uma câmera fotográfica analógica, um colar com esferas, blusa clara e calça escura.

Nascida em Boston, Ruth Orkin sempre foi apaixonada pela arte de fotografar. Com 10 anos, ganhou sua primeira câmera, uma Univex de 39 centavos de dólar. Aos 17, fez uma viagem de bicicleta, na qual atravessou os Estados Unidos para visitar a Feira Mundial de 1939, e registrou todo o trajeto percorrido.

 
Ruth Orkin com o semblante feliz e sorriso no canto do rosto está segurando uma câmera fotográfica. Seus olhos aparentam estar direcionados para uma figura que a traz felicidade. Ela usa uma blusa branca de botão, uma calça preta e um cinto da mesma cor. Em seu pescoço, a fotógrafa carrega um cordão de pérolas; vestimenta e acessórios muito característicos da época.
Ruth Orkin

Orkin frequentou o curso de fotojornalismo por um breve período, na Los Angeles City College, mas, em 1941, o abandonou. Fato ocasionado pelas políticas preconceituosas do sindicato, que não permitiam a integração de mulheres no setor de cinema. Com isso, no mesmo ano, Ruth ingressou no Corpo Feminino do Exército norte-americano na esperança de realizar o sonho de tornar-se uma cineasta, mas saiu após perceber que continuaria distante de seu objetivo profissional.

Em 1943, a fotógrafa se mudou para Nova York, onde atuou como fotojornalista freelancer. Dois anos depois começou a trabalhar para o New York Times e a publicar suas imagens em revistas mundialmente renomadas. Em 1951, quando planejava ilustrar um cenário que incentiva mulheres a viajarem sozinhas, Ruth “estourou” na mídia com uma de suas fotografias mais conhecidas: “American Girl in Italy”.

 
Ninalee Allen caminha pelas ruas de Florença, onde é assediada por uma multidão de homens que está a sua volta.  A modelo segura sua bolsa e seu xale próximos ao corpo, com visível desconforto. O movimento aparente de seu corpo transmite a impressão de que Allen está apressada, tentando passar o mais rápido possível por essa incômoda situação.
Ruth Orkin
Menina, aparentemente jovem, de olhar distante. A modelo parece estar sentada em um restaurante ou em outro lugar público, e passa uma sensação de tranquilidade, pois tem o semblante sereno e angelical.
Ruth Orkin
Um grupo de senhoras, aparentemente conhecidas entre si, andando por uma calçada movimentada. Todas bem vestidas e elegantes, passando a impressão de estarem indo a algum evento e pertencerem a uma classe financeira alta.
Ruth Orkin

Ruth Orkin faleceu aos 63 anos, em 1983, após uma longa luta contra o câncer. Em razão de suas belíssimas obras e de sua luta feminista no quesito trabalhista e pessoal, a fotógrafa se tornou inspiração para muitas mulheres, dentro e fora do universo profissional e, por isso, sua memória será sempre preservada. 

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