Categoria: Leitura

  • “Black Archives”, o acervo fotográfico negro

     Você sabia que existem centenas de imagens históricas das experiências negras disponíveis em um acervo online? Indico a vocês a coleção Black Archives. 

    Criado por Renata Cherlise em 2015, a plataforma multimídia Black Archives (Arquivo preto) apresenta com destaque a experiência negra nos Estados Unidos, a partir de um acervo de fotografias que remontam de modo dinâmico, o passado, presente e futuro da população negra, de forma bela e pouco vista. 
    Para além do comum, a proposta apresentada pelo perfil é explorar as várias formas da vida negra, retratar o cotidiano de maneira icônica, sem estereótipos. Promovendo novas perspectivas e inspirando usuários que buscam legados daqueles que os antecederam. 
    As fotografias publicadas na página possibilitam uma experiência única, elas contam histórias a partir de uma representação autêntica e inspiradora, seja pela moda, seja pela simples expressão de um momento normal para os rostos estampados. O acervo é transformador para aqueles buscam referencias dos negros em todos os lugares. 
    Black Archives, possui também,  um site oficial, onde você encontra relatos, histórias, vídeos e referências da cultura. E para ter a experiência completa, acesse o Instagram blackarchives.co. 
    Greenville, Carolina do Sul. Fotografias de Margaret Bourke-White (1958)

    Greenville, Carolina do Sul. Fotografias de Margaret Bourke-White (1958)

    Greenville, Carolina do Sul. Fotografias de Margaret Bourke-White (1958)
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  • O Orfanato da Srta. Peregrine para Crianças Peculiares

    O Orfanato da Srta. Peregrine para Crianças Peculiares

     Uma história de ficção criada a partir de fotografias antigas? Conheça a literatura verbo-visual de Ransom Riggs!

    Você com certeza deve ter lembranças de livros infantis e infanto-juvenis repletos de ilustrações que ajudam a tornar a leitura mais interessante, lúdica e colorida. Mas o livro sobre o qual vou falar hoje neste #dicade é um pouco diferente daqueles que você já deve conhecer. Na verdade, ele é bastante surpreendente se levarmos em consideração como se deu o seu processo criativo. Uma dica: tem tudo a ver com o que nós do Cultura Fotográfica amamos. Isso mesmo… fotografia!

    Um exemplar do livro é visto sobre uma mesa próximo a outras obras literárias, com um pires com biscoitos e uma xícara de café parcialmente visíveis no lado esquerdo na imagem. 
    Kaio Veloso. Capa de O Orfanato da Srta. Peregrine para Crianças Peculiares.

    A experiência de leitura de O Orfanato da Srta. Peregrine para Crianças Peculiares, publicado no Brasil pelas editoras Leya e Intrínseca, não poderia ter sido mais curiosa. Jamais poderia imaginar que aquela imagem da capa – uma garotinha flutuando alguns centímetros acima do chão, claramente uma montagem (do tipo tosco, que te faz querer rir) – poderia indicar, assim como as demais presentes ao longo do livro, algo mais do que um teor meramente ilustrativo. É com muita estranheza que adentra-se na história criada pelo americano Ransom Riggs , que começou a ter seus volumes publicados em 2011 e foi adaptado para o cinema em 2016, sob direção de Tim Burton.

    Se até certa altura o fato de as personagens descritas terem as mesmas características que aquelas figuras misteriosas das fotografias parece uma mera coincidência (Ele deve ter tido sorte em achar essas fotos para o livro) ou uma estratégia pensada (Elas devem ter sido produzidas exatamente para isso) logo, as coisas começam a ficar um pouco mais complexas, afinal, parece que ambas as coisas, imagens e texto, são praticamente uma coisa só. Mas como isso é possível? A resposta vem ao final do livro, quando há uma listagem de colecionadores de fotografias vintage (o próprio Rigs consta na lista) e as coisas começam a ficar um pouco mais claras.

    Tudo bem. As fotos são reais. Mas por quê alguém tiraria fotos tão estranhas e com esses efeitos de décadas atrás? Afinal, não estamos falando de uma foto posada em uma reunião de família ou uma cena de um cotidiano bucólico, mas de uma garota que parece segurar uma luz sinistra, gêmeos em fantasias esquisitíssimas e a já citada  garota flutuante. Nesse ponto, as coisas já ficam mais nebulosas. É difícil dizer ao certo quais são as histórias por trás dessas imagens, mas o que podemos afirmar é que truques antigos de montagem fotográfica foram usados para criar muitas dessas cenas.

    O livro é visto aberto sobre uma mesa. Na página esquerda, há uma fotografia de uma criança que olha diretamente para a câmera, com olhos iluminados e com as mãos em forma de cúpula de onde emana uma luz branca. Na página direita, há texto corrido. 
    Kaio Veloso. Visão interna do livro O Orfanato da Srta. Peregrine para Crianças Peculiares.

    O mais legal nisso tudo é que o processo criativo aconteceu a partir de uma  sugestão do editor de Riggs (que originalmente apenas faria um livro especialmente para o Halloween com uma seleção da sua coleção pessoal de fotografias antigas) que lhe incentivou a criar um romance a partir das imagens, imaginando como seria uma história em que aquelas crianças estranhas fossem as personagens. E assim, nasceu a saga que acompanha Jacob Portman, um garoto de 16 anos que parte para uma viagem ao País de Gales para buscar  a verdade sobre o assassinato de sua avó, e descobre crianças com dons especiais, tais como invisibilidade e manipulação de fogo, vivendo no orfanato da Srta. Peregrine, uma mulher que é capaz de se transformar em um falcão, isso dentro de uma fenda temporal que os mantêm na década de 1940 como meio de sobreviverem a seus inimigos. 

    Pode-se dizer então que os livros que compõe a série (as continuações são os títulos Cidade dos Etéreos, Biblioteca das Almas e Mapa dos Dias) possuem uma forma de narrativa verbo-visual, já que as imagens presentes vão além da mera função de ilustração, mas compõem parte da história, sendo inspiração e parte dela ao mesmo tempo, à medida em que são mencionadas no texto e ajudam a compreendê-lo e até mesmo adentrar com mais intensidade na obra.

    Você pode adquirir o livro aqui  e aqui

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  • “Frank” Amy Winehouse pelas lentes de Charles Moriarty

    A capa de um disco pode ser tão interessante quanto as músicas. Convido, vocês a experimentarem o álbum “Frank” de Amy Winehouse.

    Para os apreciadores de músicas, a capa de um disco torna-se tão interessante quanto as canções. Afinal, em muitos casos, o conceito visual está diretamente ligado ao momento de composição ou de criação da artista ou da intérprete. Como é o caso do álbum de estreia da cantora britânica Amy Winehouse.
    Lançado em 20 de outubro de 2003, o álbum intitulado “Frank”, em referência ao cantor Frank Sinatra, artista de espírito carregado ou de personalidade forte, pode ser captado como atmosfera central do CD, que conta com 13 faixas e se conceitua como um retrato íntimo das experiências de uma jovem de 19 anos.
      Capa do álbum Frank, de Amy Winehouse.

    O fotógrafo Charles Moriarty é o nome por trás da capa de Frank. O álbum de Jazz e Neo Soul, carrega a imagem de um momento de descontração da cantora passeando com dois cachorros. O ensaio produzido por Moriarty carregava um conceito íntimo e cheio de vitalidade, como a personalidade da cantora. Em entrevista ao site britânico “Dazed”, em 2017, o fotógrafo conta que  “Não era para ser a projeção de uma garota na indústria musical ou de uma garota lançando o primeiro álbum, era apenas para ser a Amy”.  
    O álbum que apresenta singles como Stronger Than Me e Fuck Me Pumps, se constrói em atmosferas de força, delicadeza e personalidade. Um disco coeso, desde sua composição visual que dialoga muito bem com a proposta de trazer o lado íntimo, feminino, forte e delicado para apresentar uma artista genial. 
     
    Confira algumas fotos do ensaio de composição visual de “Frank”. 
    Amy Winehouse, Nova Iorque 2003, CHARLES MORIARTY
    Amy Winehouse, Nova Iorque 2003, CHARLES MORIARTY

    Amy Laughing, The Ritz Tower, Nova York 2003

    E aí, o gostaram do #dicade de hoje? Conte-nos sua impressão sobre o álbum Frank e sua composição musical e visual. O que acharam? Compartilhe conosco aqui ou em nosso instagram.

  • Carta para Jane (1972)

     Para refletir sobre o papel dos intelectuais na revolução, Godard produziu Carta para Jane, uma verdadeira aula de como ler uma fotografia.


    Foto publicada no jornal L’express, em 1972, mostrando a atriz Jane Fonda conversando com habitantes de Hanói.
    Descrição: Fotografia em preto e branco. Mostra Jane Fonda, à esquerda, olha atentamente para pessoas que estão à sua frente de costas para a fotografia.
    Em 1972, o Vietnã do Sul e o Vietnã do Norte se encontravam em guerra e os Estados Unidos recebiam constantes críticas por seu apoio ao Vietnã do Sul que resultava em estratégias violentas contra o norte, quando um episódio excepcional se desenrolou: a estrela de Hollywood Jane Fonda viajou a Hanói, convidada pelo governo do Vietnã do Norte, onde visitou as tropas norte vietnamitas, fez transmissões na rádio do país e foi fotografada com prisioneiros de guerra americanos e em uma base utilizada para derrubar aviões dos Estados Unidos. A visita foi resultado de sua militância contra a Guerra do Vietnã e, principalmente, contra a participação dos Estados Unidos no conflito, e foi planejada como uma propaganda pelos norte vietnamitas. O episódio rendeu a ela o apelido “Hanoi Jane”, pelo qual ela é conhecida até hoje, além de ser considerada uma traidora da pátria pelo americanos.
    Porém, enquanto os americanos a julgavam pela propaganda que realizou no país, os cineastas franceses Jean-Luc Godard e Jean-Pierre Gorin, tinham outras críticas a fazer sobre o ocorrido, lançando um curta-metragem para analisar a situação. “Carta para Jane”, é o resultado da reflexão de dois comunistas que desejam pôr uma amiga da revolução no caminho certo, e eles o farão através da leitura de uma única foto. Apesar de ter sido lançado para o cinema, o filme é muito parecido com o que conhecemos hoje como podcast, tendo algumas fotos exibidas (obviamente, a foto a ser analisada ocupa mais tempo na tela), enquanto Godard e Gorin literalmente leem uma carta para Jane.
    A foto que inspirou o filme foi publicada no jornal francês L’express, em agosto de 72, e a justificativa dos cineastas para que essa foto fosse analisada é que “milhares de pessoas usaram essa foto para ir ao Vietnã” e resta saber “como foram”, qual a maneira que as foto as transportou ao país asiático. Eles também utilizam a fotografia para discutir que papel devem ter os intelectuais na revolução, visto que ambos são diretores de cinema e o uso de imagens faz parte do seu método de revolucionar.
    A foto em questão  mostra a americana olhando uma pessoa a sua frente (um vietnamita), com uma expressão séria. A pessoa que ela observa está de costas para a foto e não é possível ver o seu rosto, enquanto o da própria atriz é visível. Em segundo plano supostos vietnamitas aparecem desfocados. Os diretores, porém, buscam interpretar, além da própria imagem, fatores externos a ela.
    Esse modo de interpretar me remeteu imediatamente ao ensaio “A mensagem fotográfica”, no qual seu autor, Roland Barthes, organizou os meios de construção da mensagem da fotografia de imprensa, cuja a totalidade “é constituída por uma fonte emissora, um canal de transmissão e um meio receptor. A fonte emissora é a redação do jornal […] O meio receptor é o público que lê o jornal. E o canal de transmissão é o próprio jornal…”. Não é absurdo, portanto, que Godard e Gorin considerem como elementos da sua análise o fato de que a foto foi feita do jeito que foi feita para que pudesse ser veiculada nos jornais ocidentais. Assim sendo, havia um  meio receptor específico para o qual a mensagem foi construída, além de um canal de transmissão que era alheio ao assunto da fotografia. Além disso, eles destacam que o texto que acompanha a foto, incluindo a informação sobre o fotógrafo e a atriz, foi escrito pelos redatores do jornal, sem consultar a delegação vietnamita na França, isto é, a fotografia possui uma fonte emissora que também tinha propósitos diferentes aos daquele que visavam os norte vietnamitas.
    A redação do jornal também é responsável pelas legendas da fotografia, fonte conflituosa de interesses, pois como Godard e Gorin enfatizam: “Essa fotografia, como toda fotografia, é fisicamente muda e fala pela boca da sua legenda”. E, neste caso, a legenda diz “Jane Fonda faz perguntas ao povo de Hanói”, enquanto a imagem mostra Jane de lábios fechados, aparentemente apenas escutando, enquanto o jornal não se preocupa em apresentar as perguntas que foram feitas ou as respostas que foram dadas. O jornal dá importância apenas à estrela de Hollywood, seja ouvindo ou perguntando, e não ao outro lado implicado na ação de ouvir ou perguntar.
    O que os diretores consideram “elementos menos elementares”, por sua vez, fala dos aspectos da composição, aqueles escolhidos pelo fotógrafo para que a foto chegasse no L’express. Eles citam a escolha de deixar Jane no plano principal (enquanto aos vietnamitas estão reservados os plano internos), o enquadramento que mostra a atriz que olha e não quem ela olha e a escolha do contra-plongé, que, como eles esclarecem, seus significados sociais já haviam sido delimitados por Orson Welles em seus primeiros filmes como um modo de colocar o ator enquadrado em uma posição de superioridade, ou no caso de Jane Fonda, na posição de uma estrela de Hollywood.
    Em conjunto com esses fatores, há a escolha das outras fotos que constroem a fotorreportagem do L’express, mostrando a atriz em cenas banais no Vietnã, sem que as fotos conversem entre si (principalmente para explicar o que não se pode captar na foto principal) e sem que o texto que as acompanha dê mais detalhes sobre os habitantes de Hanói que aparecem ali. Essas acepções também me remeteram a “Mensagem Fotográfica”, em uma parte específica em que é citada a relação entre o texto e a fotografia para a construção da mensagem. Para Barthes, o texto é um parasita da imagem que traz a tona significados secundários, como uma moral que não se pode ver. A legenda da foto em Hanói, ao sugerir uma conversa, preencheria, segundo Godard e Gorin, a expressão vazia de Jane de empatia e benevolência.
    Eu acredito que se a legenda nesse caso obtém êxito, é porque se une a um elemento que Barthes denomina “pose”. Mesmo que não estivesse consciente da fotografia, a maneira como foi retratada, com o olhar focado na pessoa que fala consigo (mesmo se esse foco tiver durado só o mísero instante que o obturador foi acionado) faz com que a fotografia aceite a legenda. Além disso, a combinação das fotografias dentro da reportagem pode ser vista como um processo que o semiólogo denomina “sintaxe”, ou seja, a mensagem é influenciada pela leitura da sequência de fotografias. Assim, se as outras fotografias relatassem outros momentos da suposta conversa com os vietnamitas, a construção da mensagem poderia pender para um maior protagonismo dos revolucionários.
    O filme foi capaz de me trazer essas e várias outras referências de leitura fotográfica, algumas que eu nem sabia possuir e, mesmo que eu ache que Godard e Gorin estavam agindo de má-fé e utilizando dos conhecimentos sobre composição fotográfica para tornar a sua interpretação verdadeira, me vi utilizando as minhas próprias referências para contemplar as referidas no filme, construindo aquela análise que nem era a minha. Não é à toa que, quando Susan Sontag trata do filme em seu livro ao discorrer sobre legendas de fotografias, o considera “uma lição exemplar de como ler qualquer foto, como decifrar a natureza não inocente do enquadramento, do ângulo, do foco de uma foto”. Na minha opinião (e eu me sinto à vontade para usar a expressão, tendo em vista a imensa quantidade de vezes que é usada no filme), é também um exemplo de como todos os princípios compositivos e aspectos da denotação e conotação fotográfica podem ser usados para reconstruir a mensagem da fotografia, de acordo com o sentido social que foi produzido em cima desses artifícios.

    Referências:

  • Pássaro do Oriente

    Um filme misterioso e que usa sua fotografia para criar uma atmosfera única.

    Todo mês diversos filmes entram na plataforma da Netflix, e em meio a dezenas de lançamentos, algumas boas produções passam um pouco despercebidas. É o caso de Pássaro do Oriente, lançado em 2019, dirigido por Wash Westmoreland e baseado no livro homônimo da britânica Susanna Jones. O filme conta a história de Lucy, uma mulher sueca que tem uma vida solitária no Japão, até conhecer um fotógrafo e uma americana recém-chegada.
    Legenda: pôster do filme (2019)
    Descrição: montagem que mostra três pessoas dentro de um círculo em posições diferentes, com as informações sobre o filme escritos ao redor.
    A primeira cena do filme já nos revela algo chocante: um desses personagens está desaparecido e um corpo semelhante ao dessa pessoa foi encontrado. A partir disso a história é contada em flashbacks, acumulando situações aparentemente cotidianas, em que os personagens revelam um comportamento cada vez mais estranho, trabalhando temas como culpa e obsessão. O elenco transmite muito bem essa sensação de intriga e de falso conforto.
    O longa não tem uma narrativa muito convencional, e o ritmo é um pouco lento, mas mesmo com cenas mais “calmas”, ele consegue criar uma atmosfera de suspense incrível, principalmente graças a sua cinematografia. O diretor de fotografia Chung-Hoon Chung usa cores lavadas, pálidas, e em quase todos os momentos há pouca luz em cena. Há uma escuridão constante, o que faz com que o espectador fique sempre esperando algo ruim acontecer. Esse é um dos filmes que vi em que a fotografia mais contribui para contar a história.
    Legenda: cena do filme Pássaro do Oriente (2019)
    Descrição: dois homens encaram uma mulher em um interrogatório. As cores das roupas que as pessoas usam e do ambiente ao redor são tons frios.
    Aliás, a fotografia não está presente somente na parte técnica, sendo também um ponto fundamental da trama. O relacionamento entre a protagonista e o fotógrafo japonês é construído através de uma foto que ele faz dela enquanto ela passa na rua. A partir desse momento, ele cria uma fixação pela imagem da protagonista, que só vamos entendendo a medida que o filme caminha.
    Legenda: cena do filme Pássaro do Oriente (2019)
    Descrição: um homem segurando uma câmera observa algo fora do enquadramento em que um parque. 
    Pássaro do Oriente é um filme único da Netflix, um suspense intrigante e bem-construído, e que aborda diversas temáticas interessantes. Outro ponto interessante é que, por se passar no Japão, o filme explora uma língua, uma cultura e cenários diferentes dos filmes ocidentais. Mesmo se a história não te interessar, vale a pena conferir para ver como a direção de fotografia tem um papel fundamental na construção de atmosfera e suspense.
    Já assistiu ao filme? Comente suas impressões aqui embaixo com a gente! E para mais conteúdos sobre fotografia, siga nosso perfil no Instagram.

    Links, Referências e Créditos

  • Era Uma Vez No Oeste: Fotografia e Música

    Era Uma Vez No Oeste: Fotografia e Música

    Nesta obra de Sergio Leone a fotografia se encontra com a música de Ennio Morricone para criar um dos mais icônicos westerns já feito.

    Era Uma Vez No Oeste é um filme do gênero Spaghetti Western, dirigido Sergio Leone e lançado em 1968. Por buscar fugir dos clichês dos filmes de sua época e por ter um ritmo muito lento, ele foi mais um dos filmes que no lançamento foram fracassos de bilheteria e crítica, mas que no decorrer de vários anos passou a ser visto como revolucionário, e hoje, ele é considerado como o ápice dos filmes de velho-oeste.

    No pôster do filme vemos os rostos dos três protagonistas e do vilão no canto inferior direito, e logo ao lado um desenho de uma das cenas de tiroteio do filme.
    Pôster do Filme

    O filme tem como protagonistas três personagens: Cheyenne, um chefe de gangue. Jill, uma prostituta de Nova Orleans que se casa e vai para o oeste viver com seu marido. E por último Harmônica, um homem misterioso que busca vingança contra um pistoleiro chamado Frank.

    Quando Jill chega em sua nova casa descobre que seu marido foi morto, o assassino é Frank, que tenta forjar evidências para culpar Cheyenne, com isso os caminhos dos protagonistas se entrelaçam e eles partem em busca de vingança.

    Por mais que o enredo  pareça um clichê de heróis vingativos, a progressão da história mostra que os personagens são bem mais complexos do que aparentam, demonstrado uma quebra das convenções do seu gênero.

    Não é só na narrativa que ele foi contra as convenções de sua época. Para esse projeto, Sergio Leone, Pediu que o compositor Ennio Morricone compusesse a trilha sonora antes mesmo de começar as filmagens, assim toda a direção de fotografia teve como base a trilha sonora. Por isso, movimentação de câmera, iluminação, saturação das cores e posição dos personagens conversam perfeitamente com a música. 

    Um bom exemplo é a cena na qual os três personagens principais se encontram pela primeira vez. Ela acontece dentro de um bar escuro, Jill e todos presentes no local estão tensos com a chegada de Cheyenne, o silêncio predomina enquanto ele abre uma garrafa de bebida, mas é interrompido pela música de uma gaita, a música é aguda, áspera e muito misteriosa, combina perfeitamente com a atmosfera do lugar. Cheyenne olha para o lado onde está sentado um homem imerso em sombras, a música começa a ficar mais alta e Chayene joga um lampião em direção a figura misteriosa e nos revela Harmônica.

    A maneira como Leone usa as sombras, e planos detalhes nos personagens para compor o sentimento de suspense e perigo é complementada, com maestria, pela trilha sonora, resultando em uma das melhores introduções de personagens do cinema. Esse elo entre a fotografia e música é revolucionário, não somente por criar uma atmosfera de suspense na cena, mas também por contar a história sem  a necessidade de falas.

    Hoje temos uma famoso diretor de cinema que se inspira muito nesse filme e que ficou famoso por usar essa mesma técnica! Você sabe quem é? Deixe a resposta aqui nos comentários! E não se esqueça de nos seguir no Instagram para ficar por dentro das novas postagens, e ver os conteúdos exclusivos que publicamos por lá!

    Fontes, Links e referências.

    Como citar esta postagem

    CAVALHEIRO, Pedro Olavo Pedroso. Era Uma Vez No Oeste: Fotografia e Música. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em: <https://culturafotografica.com.br/era-uma-vez-no-oeste-fotografia-e-musica/>. Publicado em: 16 de out. de 2020. Acessado em: [informar data].

  • Retratos de Uma Obsessão

    Nessa história, acompanhamos Seymour Parrish (Robin Williams), um homem pacato, que trabalha no guichê de revelação fotográfica de um supermercado. O filme é contado em uma narrativa em flashback, onde conhecemos a história da família Yorkin que foi alvo da obsessão de Sy.

    O filme retrata a vida solitária de Seymour Parrish, um revelador de fotos, que se torna obcecado por uma família que revela fotos em sua loja.

    Vemos um homem com uma câmera vermelha em direção ao rosto no centro da imagem, com o nome do filme logo embaixo e um homem de costas.
    Capa do filme Retratos de Uma Obsessão

    Através dos filmes que os Yorkins levam para serem revelados, Sy se torna obcecado pela família e passa a acompanhar bem de perto a vida deles. Essa família sequer imagina que Sy conhece os principais momentos registrados na vida deles. Ele revela fotos a anos e conhece várias pessoas pelas imagens, mas é no material da família Yorkin que ele projeta seus desejos diante de uma vida chata. É através dessas fotos que ele cria em sua cabeça uma história por trás do que está retratado, criando uma ideia de que tudo é perfeito.

    A família perfeita e o indivíduo solitário são os elementos usados pelo diretor Mark Romanek para criar esse drama. A Iluminação serve para enfatizar a diferença entre os três mundos mostrados na tela, o da imaginação de Sy e os da vida real. A loja Savmart tem um colorido quase hiper-realista. Sua casa é toda branca, fria. E a casa dos Yorkins é cheia de cores quentes, aconchegante.

    Cena do filme “Retratos de Uma Obsessão”

    No decorrer do filme, Sy observa a família amadurecer por meio das fotografias, mas como elas são suas únicas fontes de informação, ele acaba percebendo que aquelas pessoas não são exatamente quem ele imaginava. Depois de receber uma série de fotos que ele julga inapropriadas, sua obsessão ganha novos rumos, e vai se tornando cada vez mais perigosa. Na minha opinião, o filme cria um grande paralelo com a nossa vida atual, onde a gente acompanha a vida de muitas pessoas pelas redes sociais e se baseia só nisso quando diz que a vida de alguém é perfeita.

    Tem uma hora no filme que Sy fala que “Ninguém tira fotos das pequenas coisas, mas são elas que fazem a vida”. No final, nós espectadores somos lembrados disso de um modo devastador.

    Durante todo o filme, Sy mantém uma relação profunda com a fotografia, uma relação de respeito, afeto e admiração. O que é uma coisa muito compreensível se olharmos como sua vida é, porque ele se apega na ideia de que somente registramos momentos felizes, que não queremos esquecer.

    Agora é a sua vez, assista ao filme Retratos de uma obsessão e conta pra gente qual a sua opinião sobre Sy e a maneira como ele leva sua vida.

    #leitura é uma coluna de caráter crítico, com periodicidade semanal. É publicada toda quinta-feira pela manhã. Trata-se de uma série de críticas de imagens fotográficas de relevância artística, cultural, estética, histórica, política, social ou técnica. Nela, a autora ou o autor da postagem compartilha com os leitores a sua leitura acerca da obra abordada. Quer conhecer melhor a coluna #leitura? É só seguir este link.

     

    Links, Referências e Créditos

    Como citar essa postagem

    COSTA, Clara. Retratos de uma obsessão. Cultura Fotográfica. Publicado em: 9 de out. de 2020. Disponível em: https://culturafotografica.com.br/retratos-de-uma-obsessao/. Acessado em: [informar data].

  • 3 perfis do Instagram que você precisa conhecer

    3 perfis do Instagram que você precisa conhecer

    No #dicade hoje, conheça 3 perfis imperdíveis para seguir no Instagram!

    Que o Instagram se tornou uma das maiores redes de compartilhamento de imagens do mundo já não é novidade para ninguém. A rede social lançada em 2010 e que hoje pertence ao Facebook começou com a proposta de ser um ambiente propício para o consumo e circulação de fotografias e hoje, reúne tanto fotógrafos e fotógrafos profissionais e amadores quanto pessoas com outros interesses.

    Ainda que possa ser encontrado muito mais que fotografias ao utilizá-lo, é através da publicação de uma imagem que se dá a comunicação no aplicativo, seja o conteúdo uma foto, um vídeo ou uma arte gráfica com uma frase, por exemplo. Talvez por isso o “insta” ainda remeta tão fortemente à fotografia – essa forma de expressão que tanto amamos! – contando com uma logotipo que faz referência às antigas máquinas Polaroid.

    Hoje, vamos usar o #dicade para apresentar 3 perfis no Instagram que você precisa conhecer. Afinal, com tantos perfis e tantas imagens sendo publicadas todos os dias fica difícil saber quem seguir, não é? Em meio ao turbilhão de selfies, fotos de comida, lifestyle, pets fofinhos e mais recentemente, lives de todos os jeitos e a toda hora, há contas interessantes que merecem receber mais atenção.

    Prints de tela dos perfis do Instagram indicados

    Já parou para pensar em quantas fotógrafas você conhece? Quantas você segue no Instagram? Quantas você está apoiando e prestigiando hoje? O Women Photographers History é um perfil no insta dedicado a compartilhar trabalhos fotográficos feitos por mulheres ao longo da história. Vale muito a pena conferir e conhecer fotógrafas fantásticas como Kate Simon e Maureen Bisilliat.

    Ver essa foto no Instagram

    Maureen Bisilliat (@maureenbisilliat) . (16 de febrero, 1931) Inglaterra. Fotógrafa naturalizada brasileña de origen inglés. Llegó a Brasil por primera vez en 1952. En sus palabras, “Brasil fue una búsqueda de raíces que no tuve de niña. Nací en Inglaterra, sí, pero viví en muchos lugares. Mi padre era diplomático, lo que me obligó a vivir una especie de vida camaleónica. El destino me unió a Brasil. Fue una estancia voluntaria”. En 1987, Maureen recibió el Premio a la Mejor Fotógrafa de la Asociación de Críticos de Arte de São Paulo. . (February 16, 1931) Inglaterra. English-born Brazilian photographer. She came to Brazil for the first time in 1952, establishing herself in 1957, in the city of São Paulo. In her words, “Brazil was a search for roots which I did not have as a child. I was born in England, yes, but I lived in many places. My father was a diplomat, which forced me to live a sort of a chameleonic life. Fate tied me to Brazil. It was a willfull stay”. In 1987, Maureen Bisilliat received the Best Photographer Award from the São Paulo Association of Art Critics. . #womenphotographershistory #womenphotographers #femalephotographer #photography #photographyhistory #photographeroftheday #mujeresfotografas #herstory #MaureenBisilliat #brazilianphotographer #fotografabrasileira #fotografaslatam . Derechos de Imagen/Image Rights: Instituto Moreira Salles.

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    Agora, já parou para pensar no poder político de uma imagem? Quando fez a curadoria da exposição Levantes, George Didi-Huberman selecionou diversas fotografias de protestos políticos em diversos países ao longo da história. Além disso, também incluiu imagens mais simbólicas, que representam a repressão, a indignação e o desejo por uma mudança que leva um grupo de pessoas à ação.

    A partir dessa exposição e da publicação que derivou dela com ensaios do próprio Didi Huberman e outros pensadores contemporâneos, surgiu o projeto de pesquisa Levantes que conta com alunos, docentes e pesquisadores da UFPA e da UNIFESSPA. O projeto conta com um perfil no Instagram onde são publicadas imagens que bem poderiam ter feito parte da exposição, além de trazerem mais do contexto nacional e principalmente, amazônico (correspondendo à localidade das universidades envolvidas).

    Ver essa foto no Instagram

    Ao colocar em notas de dinheiro as imagens de trabalhadores e dos menos favorecidos economicamente, o artista visual Hal Wildson chama atenção para o dinheiro como o símbolo por excelência das relações econômicas e, por conseguinte, das relações de poder em nossa sociedade. Alçado como “denominador comum de todos os valores”, o dinheiro “se torna o mais terrível nivelador”, dizia o sociólogo G. Simmel. . Se é mesmo necessário tornar a indignação visível no espaço público, a arte política de Hal Wildson faz com que as notas assumam a função de levar mensagens e palavras de protesto para diversos espaços e diferentes pessoas. A intervenção na simbólica cédula de zero reais faz pensar sobre o acirramento das desigualdades, em um cenário no qual continua-se valorizando mais a venalidade das coisas do que a sacralidade da vida. . O gesto de Hal Wildson ecoa, à sua maneira, a conhecida obra de Cildo Meireles, na série “Inserções em Circuitos Ideológicos: projeto cédulas”, em que ele escreveu mensagens de protesto contra o Governo Militar, na década de 70, em notas de dinheiro e as colocou para circular. Essas cédulas mágicas “seriam para o espaço público o que os vaga-lumes são para uma noite de verão, ou o que as borboletas são para um dia ensolarado. É o indício de um desejo que voa, que vai aonde quer que insiste, que persiste, que resiste apesar de tudo”, escreveu, certa vez, G. Didi-Huberman. . 1, 2 e 3: Hal Wildson (@halwildson), “Não sou COVEIRO. E daí?”. 4: Cildo Meireles (@cildomeirelesoficial), “Inserções em Circuitos Ideológicos”. Fotografia de Bruno Baptistelli (@bruno_baptistelli). Texto: Julia Mota (@juliamotaf), discente da FACOM/UFPA. . #projetolevantes #arte #artesvisuais #artepolitica #artivismo #halwildson #cildomeireles #amazonia #amazon #levantes #soulevements #uprisings #resistencia #ufpa #unifesspa

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    Por fim, o perfil Iconografia da História traz uma seleção de imagens de acontecimentos tanto antigos quanto atuais e serve como um verdadeiro centro de memória do Brasil e do mundo, os acontecimentos da política, os marcos da cultura e diversos recortes temporais que de alguma forma deixaram sua marca e renderam imagens icônicas. Vale a pena conferir para conhecer, rememorar e até se divertir ao ver no mesmo local um frame de O Rei Leão e um registro de 1988 com o presidente dos Estados Unidos e, ao canto, um jovem Vladimir Putin que possivelmente o espionava a serviço da KGB.

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  • O Grande Hotel Budapeste (2014)

    O Grande Hotel Budapeste, de 2014, é uma comédia ingênua que, pode não parecer, mas ensina muito sobre fotografia.

    Cena de "O Grande Hotel Budapeste". Há um homem jovem com características indo-arábicas, utlizando um uniforme de mensageiro na cor roxa e um chapéu da mesma cor com as palavras "Lobby Boy" bordadas. Em seu rosto há um bigode pintado. Ele está na frente de um luxuoso hotel.

    O Grande Hotel Budapeste, de 2014, é uma comédia ingênua que, pode não parecer, mas ensina muito sobre fotografia.
    Cena de "O Grande Hotel Budapeste". Há um homem jovem com características indo-arábicas, utlizando um uniforme de mensageiro na cor roxa e um chapéu da mesma cor com as palavras "Lobby Boy" bordadas. Em seu rosto há um bigode pintado. Ele está na frente de um luxuoso hotel.
    Zero Mustafa, personagem de “O Grande Hotel Budapeste”.
    Descrição: Cena de “O Grande Hotel Budapeste” que mostra um homem jovem utilizando um uniforme de mensageiro na cor roxa e um chapéu da mesma cor com as palavras “Lobby Boy” bordadas. Em seu rosto há um bigode pintado. Ele está na frente de um luxuoso hotel.
    Baseado em dois livros do escritor austríaco Stefan Zweig (“Coração Impaciente” e “Êxtase da Tirania”) e dirigido por Wes Anderson, “O Grande Hotel Budapeste”, de 2014, narra como Zero Mustafa, um refugiado apátrida na fictícia República de Zubrowka, ex-mensageiro do hotel Grande Budapeste, se torna o seu proprietário ao se envolver no roubo de um quadro em 1932.
    Não são novas na literatura e no cinema as narrativas cujos protagonistas são os próprios locais em que a história se passa. São lugares cujas paredes ouviram muitas histórias e, agora, as contam. O Grande Budapeste, eu diria, conta os seus dias de glória. Desde a primeira aparição do hotel, o filme deseja nos mostrar que aquele lugar já foi palco de grande luxo e sofisticação. Contudo, como paredes não falam, a história do hotel é apresentada por dois intermediários, o Autor, personagem inspirado em Stefan Zweig, que, por sua vez, a conhece através de Zero Mustafa, que em 1968 é o proprietário do hotel já em decadência.
    A época de glória de ambos, de Zero e do Budapeste, acontece em 1932, quando Zero começa a trabalhar como mensageiro no hotel, que, naquela época, era muito bem gerido por seu concierge, o Monsieur Gustave, um homem francês muito vaidoso que tem muito orgulho do Budapeste. A República de Zubrowka é assolada por uma guerra iminente e o governo perceptivelmente é ditatorial, mas Monsieur Gustave é responsável por manter o fausto do hotel, como se uma redoma protegesse o local de perigos externos.
    O tal do “governo perceptivelmente ditatorial” se assemelha a uma fusão de vários governos europeus da Primeira à Segunda Guerra, mas o filme nunca dá nome aos bois. A situação política é evidenciada, principalmente, através de metáforas visuais que nos remetem ao repertório que muitos de nós possuímos acerca desses governos.
    Cena de "O Grande Hotel Budapeste". Há uma construção cor-de-rosa luxuosa. Nela há bandeiras pretas com um síbolo vermelho e branco que se assemelha a duas letras "Z". Há tanques de exercícito com militares armados na sua frente.
    Militares e um símbolo característico indicam o começo de uma guerra. Alguma semelhança com a realidade? – Cena de “O Grande Hotel Budapeste”.
    Descrição: Cena de “O Grande Hotel Budapeste”. Mostra uma construção cor-de-rosa luxuosa. Nela há bandeiras pretas com um símbolo vermelho e branco que se assemelha a duas letras “Z”. Há tanques de exército com militares armados na sua frente.
    Aliás, é a partir de metáforas visuais que os aspectos mais importantes desse filme são construídos, como o protagonismo do hotel e o humor absurdista. A construção do hotel, por exemplo, serve para definir, na obra, o que é luxuoso e o que é simples, o que é seguro e o que é perigoso. Para isso, o filme utiliza alguns princípios compositivos da fotografia que nós bem conhecemos, como proporção, pontos de vista e regra dos terços.

    Arte e visual

    A direção de fotografia do filme não é de todo inusitada para quem já assistiu outros filmes de Wes Anderson. Sua parceria com Robert Yeoman, diretor de fotografia, já soma mais de dez filmes. O abuso na centralização dos elementos e da simetria, o uso de ângulos inusuais (e às vezes absurdos) para efeito cômico e o enquadramento que sempre enfatiza o ambiente como um aspecto relevante para a ação são marcas dos filmes do diretor, mas que podem ser ditas como uma construção em conjunto com Yeoman.
    Cena de "O Grande Hotel Budapeste". Um homem de meia idade está pendurado em um penhasco coberto de neve. Ele se segura apenas com as mãos.
    Pontos de vista são usados no filme para gerar o efeito de surpresa e comicidade, além de construir referências visuais com obras de comédia clássicas. – Cena de “O Grande Hotel Budapeste”.
    Descrição: Cena de “O Grande Hotel Budapeste”. Mostra um homem de meia idade pendurado em um penhasco coberto de neve. Ele se segura apenas com as mãos.
    Ao assistir aos filmes de Wes Anderson a impressão que tenho é que ele deseja usar todos os princípios de composição ao mesmo tempo, sem se importar de que sejam perceptíveis ao espectador ou pouco natural. “O Grande Hotel Budapeste”, porém, me parece sua obra mais convincente. Seus outros filmes geralmente me transmitem a sensação de que o diretor sabia o que queria, mas que o resto da equipe não conseguiu acompanhar. É o caso de “Os Excêntricos Tenenbaums”, filme do diretor que fica sempre entre a fantasia, que é a intenção, e o ridículo, que é o resultado de uma arte que não se leva a sério. A obra também não consegue ser tão esteticamente aprazível quanto O Grande Hotel Budapeste, que, não à toa, mesmo tendo perdido o Oscar de Melhor Fotografia, levou os Oscars de Melhor Produção de Arte, de Melhor Figurino e de Melhor Maquiagem e Penteados, atestando que toda a equipe artística estava comprometida com o visual do filme.
    Por esses motivos, “O Grande Hotel Budapeste” é um ótimo filme para observar os princípios compositivos da fotografia, como os que são ensinados na nossa coluna #fotografetododia.
    Cena do filme "O Grande Hotel Budapeste". Há uma luxuosa construção, à noite, com luzes acesas em todos passando por todas as suas janelas.
    As maquetes do hotel e a decoração das cenas internas foram concebidas por Adam Stockhausen, que ganhou o Oscar de Melhor Direção de Arte. – Cena de “O Grande Hotel Budapeste”.
    Descrição: Cena do filme “O Grande Hotel Budapeste”. Mostra uma luxuosa construção, à noite, com luzes acesas em  todas as suas janelas.

    Considerações

    “O Grande Hotel Budapeste” tem um visual marcante e uma fotografia que consegue utilizar os princípios de composição já conhecidos para criar cenas novas e inusitadas. Entretanto, mais do que um filme para observar aspectos da fotografia, “O Grande Hotel Budapeste” tem uma história que se sustenta e que diverte, com cenas que remetem ao clichê das comédias pastelão, mas que funciona como uma comédia madura, porque o filme se leva a sério e acredita em si. Dentro daquele mundo específico, o ridículo se torna o normal. Ademais, o seu visual de conto de fadas adulto é um alívio nesta quarentena e o filme nos faz acreditar nas palavras de Mounsier Gustave quando ele diz que “ainda resta uma centelha fraca de civilização neste matadouro selvagem que já foi conhecido como humanidade”.
    Se você gostou desta postagem, temos também um #fotografetodia sobre o filme. Confira aqui! Para receber postagens como essa no seu email, assine a nossa newsletter.