Categoria: Fotógrafas e Fotógrafos

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  • A mesa da cozinha

    A mesa da cozinha

    Fotografia de Carrie Mae Weems explora ancestralidade e feminilidade

    Como se tornar uma mulher? É difícil dizer em que momento da vida nós mulheres passamos a nos reconhecer como tais. A fotografia de Carrie Mae Weems tenta explorar essas questões ao trazer uma figura influente para muitas – a mãe – como fator chave para essa transformação.
    Carrie Mae Weems

     

    Descrição: mãe e filha sentadas sobre a mesa, a primeira no centro da imagem e a segunda a direita, as duas passam batom enquanto se olham no espelho
    A série A Mesa de Cozinha (The Kitchen Table) foi lançada em 1990. Composta de vinte fotografias e diversos textos, Carrie Mae Weems explorou a experiência e a vida da mulher preta através de cenas performadas na mesa da cozinha. Atuou em todas elas, enquanto outros personagens de sua vida – marido, filha, amigos e amigas – a rodeiam em diversas fotografias.
    A luminária aparenta ser a única fonte de luz na imagem, sendo responsável por clarear e revelar todas essas cenas. Em um jogo de luz e sombra, tudo aquilo que está iluminado nos dá a sensação de revelação, fazendo com que a imagem não seja apenas um olhar para o cotidiano de uma família, mas para a intimidade, os segredos e os sentimentos dessas figuras.
    A fotografia acima tem a mãe – que é interpretada pela própria autora da imagem – e sua filha como os personagens principais. Elas não se olham, pelo contrário, os olhos ficam presos em suas imagens refletidas pelos espelhos postos à mesa. Isso não faz com que elas não estejam cientes da presença uma da outra, já que seus movimentos, por serem idênticos, insinuam que elas repetem  essa mesma ação já a um tempo, ou que uma se espelha na outra. A forma como as duas passam batom com a mão direita e repousam a esquerda sobre a mesa, o jeito que se inclinam e abrem a boca, e, até mesmo, a maneira em que os espelhos são  predispostos, tudo isso revela um saber inconsciente, quase como um ensaio bem coreografado do que o outro está fazendo.
    Quando eu era pequena costumava brincar com os saltos altos de minha mãe. Ela, que saia de casa para o trabalho de manhã e só voltava tarde da noite, era uma figura um tanto quanto misteriosa, mas ao mesmo tempo charmosa. O salto alto que usava todos os dias não era apenas um símbolo de beleza, mas também de futuro desejável. Enquanto aqueles sapatos não me serviam, ainda não havia atingido aquele ideal imaginário que eu mesmo havia criado. Porém, apenas usá-los, enquanto via meu reflexo no espelho, já era uma forma de sanar a ansiedade de “ser mulher”. Aquela brincadeira era sobre uma feminilidade que eu desejava alcançar, era o que eu entendia como belo e  valioso.
    Me peguei a pensar sobre quem está refletindo quem. Faz sentido pensar que a mãe, sendo a figura mais velha, com mais experiência de vida, acaba por influenciar a filha que, assim como eu fazia, repete cada pequeno gesto, mesmo que inconscientemente. Assim, a mãe seria o reflexo do anseio da filha, do que é belo e do que significa ser adulto. Porém, da mesma forma, e, talvez, na mesma medida, a filha é o reflexo/representação do que a mãe era com a avó, da juventude que também teve um ímpeto de crescer e agora regressa ao papel.
    Ao olhar para o espelho, a mulher e a menina não veem apenas suas auto imagens, algo mais precioso está sobreposto no ato de se maquiar.  Existe também uma ancestralidade, um passar de conhecimento  de geração a geração, uma naturalidade de repetições de conceitos da experiência de vida. Para Carrie Mae Weems e sua filha, além do compartilhamento desses atravessamentos, é também o reflexo da vivência preta, de um lugar seguro,  onde mãe e filha podem encontrar em si o que significa ser feminino.
    #leitura é uma coluna de caráter crítico, com periodicidade semanal. É publicada toda quinta-feira pela manhã. Trata-se de uma série de críticas de imagens fotográficas de relevância artística, cultural, estética, histórica, política, social ou técnica. Nela, a autora ou o autor da postagem compartilha com os leitores a sua leitura acerca da obra abordada. Quer conhecer melhor a coluna #leitura? É só seguir este link.

    Como citar esta postagem

    LISBOA, Eliade. A mesa da cozinha. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em: <https://culturafotografica.com.br/a-mesa-da-cozinha//>. Publicado em: 19 de jan. de 2022. Acessado em: [informar data].

  • Consuelo Kanaga: retratos da beleza negra

    Série de fotografias mostram a busca por um olhar delicado e carinhoso sobre a vivência preta 

    Apesar do trabalho modesto, Consuelo Kanaga conseguiu se destacar no mundo da fotografia. Com um forte enfoque sobre lutas sociais, a fotógrafa americana passou parte de sua carreira dando sua atenção para a experiência negra. Dentre suas fotografias, os retratos são aqueles que mais se destacam, por carregar uma singelidade e atenção ao representar o mundano. 

    Consuelo Kanaga

    Descrição: retrato de uma criança com os cabelos presos, uma blusa de manga comprida, segurando uma flor enquanto a cheira, com uma expressão de felicidade
    Consuelo Kanaga foi uma fotógrafa americana, nascida em 25 de maio de 1894, em Astoria, cidade de Oregon. Trabalhou entre 1915 e 1922 como escritora e repórter para o San Francisco Chronicle, um jornal localizado na Califórnia, estado onde cresceu. Durante esse período, se juntou ao California Camera Club e lá conheceu o trabalho de Alfred Stieglitz, fotógrafo que se tornou sua inspiração. 
    Em 1922, depois de se mudar para Nova Iorque, passou a trabalhar como fotojornalista para o New York American. Fez publicações de fotografia para a New Masses, Labor Defender e Sunday Worker, todos veículos que falavam sobre política numa perspectiva da esquerda. A partir daí, seu trabalho começou a ser focado na vivência negra, fotografando pessoas e seus cotidianos em uma série de retratos.  
    Consuelo Kanaga

    Descrição: retrato de jovem mulher com o rosto apoiado sobre a parede, lábios cerrados em uma expressão séria

    Consuelo Kanaga

    Descrição: retrato de mãe e filho, a mãe com a cabeça inclinada para baixo com uma expressão séria, o filho, localizado mais a baixo da imagem, a olha com uma expressão pensativa

    Consuelo Kanaga

    Descrição: retrato de garota de frente, com o rosto virado para o lado e uma expressão pensativa

    Consuelo Kanaga
    Descrição: fotografia de garota virada de lado, com os braços cruzados e  com uma expressão séria 
    Consuelo Kanaga

    Descrição: fotografia de uma mãe segurando a filha no colo enquanto sorri e a menina olha para o alto

    #galeria é uma coluna de caráter informativo, com periodicidade semanal. É publicada toda segunda-feira pela manhã. Trata-se de uma série de postagens que apresenta um recorte da obra de uma fotógrafa ou fotógrafo de relevância artística, cultural, estética, histórica, política, social ou técnica, acompanhadas por uma breve biografia sua. Quer conhecer melhor a coluna #galeria? É só seguir este link.

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  • Tesão no forró

    Tesão no forró

    A fotografia de Nair Benedicto que pode te dar vontade de dançar ao som do forró

    A fotografia intitulada “Tesão no forró” me transmite tranquilidade, entrega intensa ao momento retratado e uma sensualidade evidente. Na imagem, percebemos, em um primeiro plano, um homem e uma mulher abraçados, possivelmente dançando ao som inebriante do forró.

    A fotografia mostra um local com várias pessoas. No centro, vemos um casal dançando agarradinho. Ele, vestido com uma camisa xadrez e um colete, segura a parceira pela cintura enquanto beija seu pescoço. Ela, trajada com uma blusa ou um vestido sem mangas, abraça e coloca seus braços nas costas dele.
    Nair Benedicto

    O casal está dançando agarradinho. Ele, vestido com uma camisa xadrez e um colete, segura a parceira pela cintura. Ela, trajada com uma blusa ou vestido sem mangas e um lenço estampado na cabeça, abraça o moço e coloca seus braços nas costas dele. O homem beija com sensualidade o pescoço da companheira e parece que ela, com os olhos fechados, se delicia com essa atitude afetuosa.

    Essa fotografia me remete diretamente aos alegres momentos em que eu dançava com o meu companheiro. A tranquilidade e a entrega completa de um ao outro é uma belíssima síntese desses momentos de confiança e conforto que compartilhei com o meu parceiro. Espero que todos e todas sintam esse sentimento de cumplicidade, serenidade e sensualidade.

    Nair Benedicto, responsável pelo registro, explica que, em meados do ano de 1980, estava fazendo um trabalho independente sobre segregação e discriminação contra os nordestinos e as nordestinas que viviam em São Paulo. Em decorrência disso, a curiosidade em saber e em ver como essas pessoas se divertiam foi despertada em Nair. Assim, através de algumas indicações, a fotógrafa descobriu que os e as migrantes iam a casas de forró, dentre as quais a mais conhecida era a do Mário Zan.

    A imagem parece que carrega, com a dança típica nordestina, resistência e pertencimento, pois a foto gera visibilidade de uma população quase sempre marginalizada.  O forró também pode ser considerado um ato revolucionário, pois os nordestinos e as nordestinas se divertem e dançam em uma São Paulo que só os enxergam como mão de obra marginalizada.

    A fotógrafa faz uso do flash devido à baixa luminosidade do local, o que faz com que a pele suada da mulher fique com um aspecto brilhante. Acho que está evidente o bem-estar e o conforto estampado no rosto e no corpo dessa mulher, com a entrega proporcionada pelo momento de afeto. Outra coisa interessante é que parece que ela não está desconfortável com a presença da câmera e nem com o que está acontecendo ao redor.

    Em oposição ao conforto desta mulher, é possível perceber um jovem no canto da fotografia que nota a presença da câmera e parece haver certo incômodo em seu semblante. O corpo dele aparenta ficar mais enrijecido, por causa do aspecto tenso de suas mãos, e o movimento se esvai de seu corpo, logo dá a impressão de que o homem está parado enquanto todos dançam. O motivo do incômodo, nós nunca saberemos.

    #galeria é uma coluna de caráter informativo, com periodicidade semanal. É publicada toda terça-feira pela manhã. Trata-se de uma série de postagens que apresenta um recorte da obra de uma fotógrafa ou fotógrafo de relevância artística, cultural, estética, histórica, política, social ou técnica, acompanhadas por uma breve biografia sua. Quer conhecer melhor a coluna #galeria? É só seguir este link.

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    HELENA, Beatriz. Tesão no forró. Cultura Fotográfica. Disponível em: https://culturafotografica.com.br/tesao-no-forro/. Publicado em: 12 de jan. de 2022. Acessado em: [informar data].

  • Lola Álvarez Bravo

    Fotógrafa mexicana que retrata o cotidiano do povo mexicano

    Lola Álvarez Bravo nasceu em Jalisco, estado mexicano , no ano de 1907. Seu trabalho fotográfico ficou conhecido por retratar o cotidiano das pessoas que ali viviam, principalmente das mulheres em ambientes urbanos e rurais.

    A fotografia mostra a pintora Frida Kahlo com um vestido longo e sua imagem refletida em um espelho. Há a presença de dois cachorros perto dela. Um deles está cheirando as pernas de Frida e o outro, o chão.
    Lola Álvarez Bravo

    Em 1916, Lola  se mudou para a Cidade do México, local que foi extremamente importante para a sua formação fotográfica, além de ser o lugar onde ela se casou com o seu parceiro de profissão, Manuel Álvarez Bravo, em 1924. Reconhecida como uma figura central na fotografia mexicana, Lola iniciou sua carreira como fotógrafa em meados da década de 1930, colaborando na revista El Maestro Rural.

    Ela trabalhou em mais de um nicho fotográfico – o fotojornalismo, o retrato profissional, a fotografia comercial e a documental -, além de ter sido artista plástica. Lola retratou, por meio de imagens documentais, a vida cotidiana nas ruas das cidades mexicanas. Ela também tirou fotos de sua amiga, Frida Kahlo, na década de 1940.  Em 1951, Lola assumiu a direção de Fotografia do Instituto Nacional de Belas Artes e abriu uma galeria de arte, onde divulgou a obra de Frida Kahlo na Cidade do México, além de mostrar várias fotografias de sua autoria.

    A fotografia mostra três lances de escada que formam linhas diagonais. Em cada lance há um homem de terno, totalizando três figuras.  Além disso, podemos perceber a silhueta da fotógrafa, pois sua sombra aparece na foto.
    Lola Álvarez Bravo
    A fotografia mostra uma menina, com duas tranças no cabelo, que parece estar vestida com uma blusa ou um vestido de mangas longas e colares no pescoço. Ela também segura um cobertor estampado contra o seu corpo.
    Lola Álvarez Bravo
    A fotografia mostra a artista Frida Kahlo sentada, com os braços apoiados em suas pernas e uma de suas mãos serve de apoio para a sua cabeça. Ela está vestida com um vestido longo e com brincos nas orelhas e anéis nos dedos.
    Lola Álvarez Bravo
    A fotografia mostra uma criança, vestida com uma blusa de mangas curtas e um macacão comprido. Ela está deitada, com os olhos fechados, em uma espécie de lona que está no chão e ao redor dela está cheio de pares de sapatos.
    Lola Álvarez Bravo
    A fotografia mostra uma mulher nua. Sua pele brilha devido à iluminação, ela  está sentada e apoiada na parede. Uma de suas mãos serve de apoio para sua cabeça e seus olhos estão fechados.
    Lola Álvarez Bravo

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    HELENA, Beatriz. Lola Álvarez Bravo. Cultura Fotográfica.Disponível em: https://culturafotografica.com.br/lola-alvarez-bravo/. Acessado em: [informar data].

  • Para Adrian Rodriguez, Com Amor

    Para Adrian Rodriguez, Com Amor

    A história do assalto responsável por ajudar na criação de todo um ensaio fotográfico

    Na primavera de 2010, a fotógrafa Melanie Willhide teve sua casa invadida por um assaltante. Ele levou vários objetos, incluindo o computador e o HD externo nos quais Willhide tinha salvo centenas de fotos de um trabalho que ela havia feito sobre festas noturnas.

    Descrição: Na foto se vê duas mulheres lado a lado. Elas estão usando penteados vintages e batons escuros. De seus ombros para baixo, a fotografia foi corrompida e podemos ver apenas listras.
    Malanie Willhide

    Porém, algumas semanas depois, a polícia de Pasadena recuperou seu computador. Infelizmente ou felizmente, o assaltante formatou a memória do computador, apagando todas as fotos. Melanie decidiu utilizar programas de recuperação de dados e conseguiu várias de suas fotografias de volta. Porém, muitas delas foram corrompidas, causando inúmeras distorções nas imagens.

    A fotógrafa, que já gostava muito de utilizar programas de manipulação de imagens no seu trabalho, adorou o resultado.  Segundo ela, as fotos surrealistas, que surgiram com a corrupção dos dados, funcionavam como uma amostra visual da crescente dependência do ser humano com os computadores.  Ao publicar as fotografias, ela decide então dedicá-las a Adrian Rodriguez, o assaltante que tornou tudo aquilo possível.

    Descrição: A foto foi muito corrompida e, na maior parte, é possível ver apenas formas geométricas de diferentes cores. Com um pouco de atenção, pode-se identificar pedaços separados de um homem que parece exibir seus músculos para a câmera.
    Malanie Willhide
    Descrição: Na foto, podemos ver uma mulher da cintura para cima. Ela está nua e com as mãos atrás da cabeça, jogando seus cabelos enrolados para cima. A foto foi corrompida e está coberta por listras pretas.
    Malanie Willhide
    Descrição: Na foto, podemos ver um homem completamente nu, que se inclina para frente e coloca a mão em sua panturrilha. A imagem  foi corrompida e é possível ver várias partes da fotografia se repetindo por todos os cantos.
    Melanie Willhide
    Descrição: A foto é espelhada no centro. Nela, um homem está parado com as mão na cintura  veste apenas um calção, enquanto alguém acerta seu rosto com o que parece ser uma torta.
    Melanie Willhide

    #galeria é uma coluna de caráter informativo, com periodicidade semanal. É publicada toda terça-feira pela manhã. Trata-se de uma série de postagens que apresenta um recorte da obra de uma fotógrafa ou fotógrafo de relevância artística, cultural, estética, histórica, política, social ou técnica, acompanhadas por uma breve biografia sua. Quer conhecer melhor a coluna #galeria? É só seguir este link.

    Como citar esta postagem

    CAVALHEIRO, Pedro Olavo Pedroso. Para Adrian Rodriguez, Com Amor. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em: <https://culturafotografica.com.br/shomei-tomatsu-e-a-globalizacao/>. Publicado em: 06 de dez. de 2021. Acessado em: [informar data].

  • Símbolos e nacionalismos

    Mustafa Hassona, nos instiga com sua fotografia que evoca o quadro “A Liberdade guiando o povo” e a História de Davi e Golias. 

    A imagem a seguir foi registrada por Mustafa Hassona na Faixa de Gaza no ano de 2018. Os conflitos que até hoje não cessaram, fazem parte da vida de Palestinos e Israelenses, que disputam o território no Oriente Médio. Na imagem observamos um homem segurando uma bandeira palestina e  girando uma funda.



    Mustafa Hassona

    A Palestina é uma área da região oriental do Mediterrâneo, que compreende partes de Israel e os territórios da Faixa de Gaza (ao longo da costa do Mar Mediterrâneo) e da Cisjordânia (a oeste do Rio Jordão).

    Tanto a área geográfica designada Palestina, quanto o status político dela, mudaram ao longo de três milênios atrás.  A região (ou pelo menos parte dela), também é conhecida como Terra Santa e é considerada sagrada para judeus, cristãos e muçulmanos. Desde meados do século XX, ela é objeto de reivindicações conflitantes de movimentos nacionalistas judeus e árabes.

    A cena registrada por Mustafa Hassona em 2018, evoca vários símbolos de luta e resistência. Ela foi muito comparada com a narrativa dos personagens bíblicos Davi e Golias, assim como com a pintura “A Liberdade guiando o povo” (imagem seguinte), do artista francês Eugène Delacroix. 

    O homem em primeiro plano, no centro da fotografia, destaca-se e dá o enredo principal à narrativa fotográfica. Ele carrega a bandeira do seu país (Palestina, uma das presenças que evocam a pintura de Delacroix) e gira uma funda (que evoca a história de Davi e Golias). Tais símbolos evidenciam uma luta coletiva e de representatividade, ou seja, a reivindicação não é somente ligada a um sujeito.

    Postas estas questões, poderia o fotojornalista, ter pensado acerca dessas proximidades? 
    Obviamente a provocação é clara, aliás os símbolos são fortemente trabalhados na sua fotografia. Podemos perceber isso pelo ângulo frontal da foto que dá destaque ao protagonista, à bandeira e a funda.

    Tais evidências, nos mostram que existe uma cultura atuante em conflitos nacionalistas. Se pensarmos em Davi e Golias, ainda não estamos falando da construção de uma nação, mas estamos operando com símbolos que representam a luta de um povo.

    As lutas sociais, portanto,  estão diretamente ligadas a esses símbolos de representatividade. Tanto na fotografia de Hassona, quanto no quadro de Delacroix, a bandeira e as armas, acentuam essa característica da reivindicação nacionalista.


    Delacroix. A liberdade guiando o povo, 1830.

    Há outra questão muito interessante para pensarmos a comparação da fotografia com pintura. A câmera fotográfica, tecnologia que surgiu em meados do XIX, foi vista com bastante relutância na época. Baudelaire dizia que a fotografia era um tipo de refúgio ao qual se apega “todos os pintores frustrados”, aliás considerava-se a imagem fotografada resultado da máquina e não do artista.

    Todavia o desenvolvimento da  história da arte e da semiótica (estudo da imagem), fluem direção contrária à essa perspectiva. Percebemos por meio desses estudos que tanto o olhar do fotógrafo para a cena, quanto as técnicas por ele trabalhadas juntas a fotografia constituem o enredo do seu trabalho.

    Sendo assim, por meio dessa fotografia de Mustafa Hassona observamos esses dois contrapontos: o da presença de uma luta nacionalista no Oriente Médio e da potencialidade e possibilidades dos registros fotográficos. Porquanto essas considerações trazem à tona a importância do olhar do fotógrafo/artista e a presença das suas referências nos resultados finais de suas narrativas.

    #leitura é uma coluna de caráter crítico, com periodicidade semanal. É publicada toda quarta-feira pela manhã. Trata-se de uma série de críticas de imagens fotográficas de relevância artística, cultural, estética, histórica, política, social ou técnica. Nela, a autora ou o autor da postagem compartilha com os leitores a sua leitura acerca da obra abordada. Quer conhecer melhor a coluna #leitura? É só seguir este link.


    Links, Referências e Créditos


    https://www.artequeacontece.com.br/fotografia-e-pintura-da-rivalidade-ao-entrosamento/


    https://www.leica-oskar-barnack-award.com/en/series-finalists/2019/mustafa-hassona.htmlLorem ipsum dolor sit amet.


    https://www.all-about-photo.com/photographers/photographer/784/mustafa-hassona


    https://www.leica-oskar-barnack-award.com/en/series-finalists/2019/mustafa-

    hassona.htmlLorem ipsum dolor sit amet.


    https://www.all-about-photo.com/photographers/photographer/784/mustafa-hassona


  • Luz à pino nas fotografias de Mustafa Hassona

    A “luz à pino” é o destaque em obras do fotojornalista palestino que registra conflitos na faixa de gaza.


    Mustafa Hassona atua desde 2007 registrando conflitos na Faixa de Gaza, Palestina. Ele trabalhou como freelancer para Agence France Press (AFP), para a Anadolu Agency (AA) e vários outros vários veículos de imprensa internacionais. Também é vencedor de vários prêmios, sendo o mais recente deles o prêmio de narrativa visual da LENSCULTURE  2019.



    Mustafa Hassona.

    A luz de Pino  é uma posição da fonte de luz em relação à cena fotografada. Hassana utiliza esse método de iluminação para direcionar o nosso olhar a experiências específicas de reivindicação na Faixa de Gaza, dentre outras. Dessa maneira, ele revela experiências específicas em meio a um cenário.Importante ressaltar que o autor usa a luz a pino de modo artificial, após realizar o registro, mediante a aplicação de recursos de pós-produção.

    Mustafa Hassona

    Mustafa Hassona


    Mustafa Hassona

    #A galeria é uma coluna de caráter informativo, com periodicidade semanal. É publicada toda segunda-feira pela manhã. Trata-se de uma série de postagens que apresenta um recorte da obra de uma fotógrafa ou fotógrafo de relevância artística, cultural, estética, histórica, política, social ou técnica, acompanhadas por uma breve biografia sua. Quer conhecer melhor a coluna #galeria? É só seguir este link.



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  • O abutre e a menina

    O abutre e a menina

    A foto que evidenciou a fome no Sudão e entrou para a história do fotojornalismo 

    O abutre e a menina é uma fotografia feita por Kevin Carter, em 11 de março de 1993, no Sudão, momento em que o país sofria uma guerra civil e enfrentava sua maior crise humanitária no século XX. A foto, que retrata uma situação de miséria e medo, mostra um abutre olhando para uma criança esquelética.

    Kevin Carter 

    A produção dessa foto foi possível em função de uma ação da Organização das Nações Unidas (ONU) para sensibilizar a opinião pública internacional em relação à situação de penúria da população sudanesa. Para isso, a ONU convidou dois fotojornalistas para integrar a comitiva que foi para o sul do Sudão: Kevin Carter e João Silva.

    O momento em que Kevin registra a foto do abutre e a menina é quando está nesse campo a céu aberto, acompanhando a distribuição de alimentos pelos funcionários da ONU e esperando alguma possibilidade de clique, até que encontra a cena da ave olhando para a criança.

    Foi essa imagem do abutre e a menina que pouco tempo depois foi publicada no jornal The New York Times e replicada em todos os grandes jornais do mundo e fez Carter ganhar grande visibilidade e a fome no Sudão ser vista e a ONU arrecadar doações para o país. Além disso, no ano seguinte, em 1994, o fotógrafo ganhou o prêmio Pulitzer de fotografia.

    Após a publicação dessa foto, Kevin teve sua postura questionada pela opinião pública que queria saber o que aconteceu com a menina e se ele a teria ajudado. Ele conta que espantou o abutre e que sentou e chorou debaixo de uma árvore. Depois também disse que a menina se levantou e caminhou até a clínica médica, onde João Silva estava fotografando. Porém, a opinião pública não ficou satisfeita com essas explicações e indagou porque ele não levou a menina para um lugar seguro.

    Toda essa história gerou um debate sobre a atuação de jornalistas e fotojornalistas em cenários de guerra, se eles deveriam prestar assistência ou apenas seremos observadores. Todos esses questionamentos perturbaram muito Carter, que não soube lidar com a situação, pois já enfrentava uma série de problemas pessoais como depressão, relacionamentos amorosos mal sucedidos, uso abusivo de álcool e outras drogas e endividamento. Assim, no dia 27 de julho de 1994, aos 33 anos, ele levou seu carro até um local de sua infância e cometeu suicídio.

    Uma descoberta importante dessa foto é que apesar de todos acharem que era uma menina na foto, na verdade, era um menino. Uma equipe de jornalistas voltou para a aldeia de Ayod, no Sudão, para reconstruir a história daquela fotografia e tentar descobrir quem era a criança, e nisso, descobriram que era um menino chamado Kong Nyong. Com essa pista, dois dias depois, a equipe chegou à família do menino. O pai confirmou que a criança da foto de Kevin Carter era seu filho e que ele se recuperou da desnutrição e sobreviveu. O pai também disse que Kong morreu já adulto em 2006, devido a uma forte febre.

    Para além de toda história por trás da foto, a relação do abutre e da menina, que parece ser somente de presa e predador, me transmite, de forma subjetiva, uma denúncia da própria ave da situação precária que a criança estava, ou seja, o abutre também tem o papel de evidenciar que aquela criança precisava de ajuda.

    Uma outra perspectiva que me desperta da fotografia é como essa foto feita há 30 anos atrás em um país localizado do outro lado do oceano atlântico remete a situação atual de fome que o Brasil enfrenta, em que o abutre ali presente pode ser representado como o governo atual brasileiro, que não cria soluções para resolver o problema e somente fica observando agravar. Já a criança pode ser representada como os 19,1 milhões de brasileiros já atingidos pela fome, conforme dados da CNN Brasil. A imagem mostra a situação do Sudão naquele momento, mas também faz alusão a outros momentos trágicos que o mundo vive, como a pandemia de COVID-19 que acentuou a fome.

    A foto no meu ver propõe uma reflexão sobre como nós, sociedade, lidamos com as desigualdades que atravessam as pessoas. Seríamos nós abutres que ficam só observando sem tomar qualquer atitude e esperando ¨apodrecer¨ ?  É sobre pensar em humanidade e alteridade.

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    CALIXTO, Vitória. O abutre e a menina. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em: <https://culturafotografica.com.br/o-abutre-e-a-menina/>. Publicado em: 24/11/2021. Acessado em: [informar data].

  • Roger Cipó

    Roger Cipó

    Fotógrafo, pesquisador, candomblecista e militante contra os crimes de intolerância religiosa e racismo.

    Roger Cipó nasceu na periferia de Diadema. É um jovem negro apaixonado pela fotografia e um homem de muita fé, por isso juntou o amor pela religião e pela arte de foto e criou nas redes sociais a plataforma Olhar de um Cipó, em que documenta as religiões de matriz africana.

    Roger Cipó

    Suas produções e pesquisas fotográficas focadas em terreiros de candomblé, tem como objetivo estudar as diversas estruturas que baseiam as sociedades afro religiosas de São Paulo, além de divulgar as belezas e riquezas existentes no cotidiano social, cultural e ritualístico das comunidades. Em seu trabalho, as fotos ultrapassam a condição de documentação e assumem o papel de instrumento sensibilizador, propondo reflexão sobre a verdadeira imagem dos cultos afros para assim, quebrar as barreiras do preconceito de quem não os conhece.

    Roger Cipó

    Roger Cipó
    Roger Cipó
    Roger Cipó

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    CALIXTO, Vitória. Roger Cipó. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em: <https://culturafotografica.com.br/roger-cipo/>. Publicado em: 22/11/2021. Acessado em: [informar a data].