De todos os olhares complexos, o de James Dean é um modelo exemplar.
James Dean foi um astro dos anos 50 e um ícone da cultura pop para qualquer tempo posterior. Famoso pela atuação, beleza e comportamento, o falecido ator, morto num acidente de carro no ano de 1955, aos 24 anos de idade, se tornou postumamente o eterno padroeiro da rebeldia e referência quando se trata de juventude. Características essas que foram muito bem captadas pela fotografia de Dennis Stock.
O ator era conhecido pela irreverência, detalhe de sua personalidade que utilizava na atuação metódica de seus personagens, também muito semelhantes ao próprio ator, como o personagem Jim Stark de Juventude Transviada, o filme mais famoso em que atuou.
Apesar da fama ascendente, na época, James Dean levantou algumas questões polêmicas. Uma delas, referia-se a vida amorosa e sexual do ator. E anos após a sua morte, muitas especulações e boatos foram levantados, em especial sobre a sua relação com Marlon Brando, outro ator consagrado e famoso pelo papel de Don Vito Corleone em O Poderoso Chefão.
Em sua biografia não autorizada, intitulada James Dean: Tomorrow Never Come (O amanhã nunca chega), escrito pelos escritores Darwin Porter e Danforth Prince, foi afirmado que Marlon Brando se apaixonou pelo olhar de James Dean, que o fizera “arder”. É afirmado também que os dois foram um casal.
Independente da veracidade dessas afirmações, a vida pública de astros do cinema, assim como a de artistas no geral, sempre estimularam o imaginário do público e sempre serviram como exemplos de vidas anônimas e privadas, mundo afora. Ao olhar para James Dean, ciente da sua suposta homossexualidade, noto que algo sempre escapa em sua discrição gritante e silêncio embriagado.
Seus olhos são sensíveis, e, não de forma rasa; seus olhos são profundamente sensibilizados. São dotados de uma sedução que quase sempre seduzem sem querer. Entretanto, seu olhar não é frágil e nem delicado. Pelo contrário, são olhos afrontosos, rebeldes, como o próprio ator fora em vida.
Para mim, James Dean é o melhor exemplo de como homens gays não são, em vias de fato, sinônimos do que é feminino ou da ausência de uma masculinidade; ainda que a escolha e a natureza de cada um não seja limitada a não ser ou ser como tal – afinal cada um possui a liberdade de se identificar como bem entende e como se reconhece intimamente.
A liberdade de escolha, expressão e identificação é justamente o cerne desta questão, pois, socialmente, existe uma pressão silenciosa de rotular determinados grupos de pessoas de forma inflexível e totalitária, que nunca condiz com a realidade individual.
James Dean é um brasão para os seus semelhantes; que é – e deveria ser visto socialmente como – a naturalidade do desejo de um homem para com outros homens. E seu olhar sedutor e penetrante – ainda que quase ingênuo – não o torna desprovido de qualidades tipicamente masculinas, como: a postura, a voz, o comportamento, a mentalidade, as roupas que veste, seus gostos pessoais e trejeitos.
Hoje a liberdade, a orientação sexual e a identidade de gênero são questões defendidas por lei. Entretanto, olhando para a época em que essa foto foi fotografada, acaba sendo muito contraditório como a virilidade de homossexuais atualmente parece ser um tabu e um incômodo a nível social.
Um exemplo muito claro disso é como, majoritariamente, o conteúdo cultural voltado para homossexuais é sempre tão feminino, tão delicado e tão limitado a estereótipos e raramente deixam de ser falocêntricos. O que faz parecer com que a orientação sexual de um indivíduo o torne incapaz de ter individualidade de escolhas, pensamentos, gostos e preferências que perpassam suas preferências sexuais.
Em outras palavras, James Dean é um totem para todos os homens gays que não se identificam com voguing, roupas femininas, saltos altos, divas pop e todas as associações culturais que lhes são atreladas. São tão pejorativas como afirmar que todo homem heterossexual gosta de futebol, por exemplo.
Sim, há muita sensibilidade em olhos como os de James Dean, mas nem sempre há delicadeza por trás desses olhares. Alguns desses olhares miram em corridas de carros, esportes, literatura, no mercado de Wall Street, em gravatas-borboleta, ou nos corpos musculosos que as vestem, com alguma malícia, com muito desejo ou com nenhuma intenção.
#leitura é uma coluna de caráter crítico, com periodicidade semanal. É publicada toda quinta-feira pela manhã. Trata-se de uma série de críticas de imagens fotográficas de relevância artística, cultural, estética, histórica, política, social ou técnica. Nela, a autora ou o autor da postagem compartilha com os leitores a sua leitura acerca da obra abordada. Quer conhecer melhor a coluna #leitura? É só seguir este link.
Links, Referências e Créditos
- A relação íntima entre James Dean e Marlon Brando – El País
- 90 anos de James Dean e a curta contribuição do galã para o cinema – Exame
- O Trágico adeus a James Dean, Símbolo de uma geração – Canal História
Como citar esta postagem
BRITO, C.S. Olhares sensíveis, não delicados. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em: <https://culturafotografica.com.br/olhares-sensiveis-nao-delicados/>. Publicado em: 09 de mar. de 2023. Acessado em: [informar data].
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