Ano: 2021

  • Para Adrian Rodriguez, Com Amor

    Para Adrian Rodriguez, Com Amor

    A história do assalto responsável por ajudar na criação de todo um ensaio fotográfico

    Na primavera de 2010, a fotógrafa Melanie Willhide teve sua casa invadida por um assaltante. Ele levou vários objetos, incluindo o computador e o HD externo nos quais Willhide tinha salvo centenas de fotos de um trabalho que ela havia feito sobre festas noturnas.

    Descrição: Na foto se vê duas mulheres lado a lado. Elas estão usando penteados vintages e batons escuros. De seus ombros para baixo, a fotografia foi corrompida e podemos ver apenas listras.
    Malanie Willhide

    Porém, algumas semanas depois, a polícia de Pasadena recuperou seu computador. Infelizmente ou felizmente, o assaltante formatou a memória do computador, apagando todas as fotos. Melanie decidiu utilizar programas de recuperação de dados e conseguiu várias de suas fotografias de volta. Porém, muitas delas foram corrompidas, causando inúmeras distorções nas imagens.

    A fotógrafa, que já gostava muito de utilizar programas de manipulação de imagens no seu trabalho, adorou o resultado.  Segundo ela, as fotos surrealistas, que surgiram com a corrupção dos dados, funcionavam como uma amostra visual da crescente dependência do ser humano com os computadores.  Ao publicar as fotografias, ela decide então dedicá-las a Adrian Rodriguez, o assaltante que tornou tudo aquilo possível.

    Descrição: A foto foi muito corrompida e, na maior parte, é possível ver apenas formas geométricas de diferentes cores. Com um pouco de atenção, pode-se identificar pedaços separados de um homem que parece exibir seus músculos para a câmera.
    Malanie Willhide
    Descrição: Na foto, podemos ver uma mulher da cintura para cima. Ela está nua e com as mãos atrás da cabeça, jogando seus cabelos enrolados para cima. A foto foi corrompida e está coberta por listras pretas.
    Malanie Willhide
    Descrição: Na foto, podemos ver um homem completamente nu, que se inclina para frente e coloca a mão em sua panturrilha. A imagem  foi corrompida e é possível ver várias partes da fotografia se repetindo por todos os cantos.
    Melanie Willhide
    Descrição: A foto é espelhada no centro. Nela, um homem está parado com as mão na cintura  veste apenas um calção, enquanto alguém acerta seu rosto com o que parece ser uma torta.
    Melanie Willhide

    #galeria é uma coluna de caráter informativo, com periodicidade semanal. É publicada toda terça-feira pela manhã. Trata-se de uma série de postagens que apresenta um recorte da obra de uma fotógrafa ou fotógrafo de relevância artística, cultural, estética, histórica, política, social ou técnica, acompanhadas por uma breve biografia sua. Quer conhecer melhor a coluna #galeria? É só seguir este link.

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    CAVALHEIRO, Pedro Olavo Pedroso. Para Adrian Rodriguez, Com Amor. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em: <https://culturafotografica.com.br/shomei-tomatsu-e-a-globalizacao/>. Publicado em: 06 de dez. de 2021. Acessado em: [informar data].

  • Símbolos e nacionalismos

    Mustafa Hassona, nos instiga com sua fotografia que evoca o quadro “A Liberdade guiando o povo” e a História de Davi e Golias. 

    A imagem a seguir foi registrada por Mustafa Hassona na Faixa de Gaza no ano de 2018. Os conflitos que até hoje não cessaram, fazem parte da vida de Palestinos e Israelenses, que disputam o território no Oriente Médio. Na imagem observamos um homem segurando uma bandeira palestina e  girando uma funda.



    Mustafa Hassona

    A Palestina é uma área da região oriental do Mediterrâneo, que compreende partes de Israel e os territórios da Faixa de Gaza (ao longo da costa do Mar Mediterrâneo) e da Cisjordânia (a oeste do Rio Jordão).

    Tanto a área geográfica designada Palestina, quanto o status político dela, mudaram ao longo de três milênios atrás.  A região (ou pelo menos parte dela), também é conhecida como Terra Santa e é considerada sagrada para judeus, cristãos e muçulmanos. Desde meados do século XX, ela é objeto de reivindicações conflitantes de movimentos nacionalistas judeus e árabes.

    A cena registrada por Mustafa Hassona em 2018, evoca vários símbolos de luta e resistência. Ela foi muito comparada com a narrativa dos personagens bíblicos Davi e Golias, assim como com a pintura “A Liberdade guiando o povo” (imagem seguinte), do artista francês Eugène Delacroix. 

    O homem em primeiro plano, no centro da fotografia, destaca-se e dá o enredo principal à narrativa fotográfica. Ele carrega a bandeira do seu país (Palestina, uma das presenças que evocam a pintura de Delacroix) e gira uma funda (que evoca a história de Davi e Golias). Tais símbolos evidenciam uma luta coletiva e de representatividade, ou seja, a reivindicação não é somente ligada a um sujeito.

    Postas estas questões, poderia o fotojornalista, ter pensado acerca dessas proximidades? 
    Obviamente a provocação é clara, aliás os símbolos são fortemente trabalhados na sua fotografia. Podemos perceber isso pelo ângulo frontal da foto que dá destaque ao protagonista, à bandeira e a funda.

    Tais evidências, nos mostram que existe uma cultura atuante em conflitos nacionalistas. Se pensarmos em Davi e Golias, ainda não estamos falando da construção de uma nação, mas estamos operando com símbolos que representam a luta de um povo.

    As lutas sociais, portanto,  estão diretamente ligadas a esses símbolos de representatividade. Tanto na fotografia de Hassona, quanto no quadro de Delacroix, a bandeira e as armas, acentuam essa característica da reivindicação nacionalista.


    Delacroix. A liberdade guiando o povo, 1830.

    Há outra questão muito interessante para pensarmos a comparação da fotografia com pintura. A câmera fotográfica, tecnologia que surgiu em meados do XIX, foi vista com bastante relutância na época. Baudelaire dizia que a fotografia era um tipo de refúgio ao qual se apega “todos os pintores frustrados”, aliás considerava-se a imagem fotografada resultado da máquina e não do artista.

    Todavia o desenvolvimento da  história da arte e da semiótica (estudo da imagem), fluem direção contrária à essa perspectiva. Percebemos por meio desses estudos que tanto o olhar do fotógrafo para a cena, quanto as técnicas por ele trabalhadas juntas a fotografia constituem o enredo do seu trabalho.

    Sendo assim, por meio dessa fotografia de Mustafa Hassona observamos esses dois contrapontos: o da presença de uma luta nacionalista no Oriente Médio e da potencialidade e possibilidades dos registros fotográficos. Porquanto essas considerações trazem à tona a importância do olhar do fotógrafo/artista e a presença das suas referências nos resultados finais de suas narrativas.

    #leitura é uma coluna de caráter crítico, com periodicidade semanal. É publicada toda quarta-feira pela manhã. Trata-se de uma série de críticas de imagens fotográficas de relevância artística, cultural, estética, histórica, política, social ou técnica. Nela, a autora ou o autor da postagem compartilha com os leitores a sua leitura acerca da obra abordada. Quer conhecer melhor a coluna #leitura? É só seguir este link.


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  • Luz à pino nas fotografias de Mustafa Hassona

    A “luz à pino” é o destaque em obras do fotojornalista palestino que registra conflitos na faixa de gaza.


    Mustafa Hassona atua desde 2007 registrando conflitos na Faixa de Gaza, Palestina. Ele trabalhou como freelancer para Agence France Press (AFP), para a Anadolu Agency (AA) e vários outros vários veículos de imprensa internacionais. Também é vencedor de vários prêmios, sendo o mais recente deles o prêmio de narrativa visual da LENSCULTURE  2019.



    Mustafa Hassona.

    A luz de Pino  é uma posição da fonte de luz em relação à cena fotografada. Hassana utiliza esse método de iluminação para direcionar o nosso olhar a experiências específicas de reivindicação na Faixa de Gaza, dentre outras. Dessa maneira, ele revela experiências específicas em meio a um cenário.Importante ressaltar que o autor usa a luz a pino de modo artificial, após realizar o registro, mediante a aplicação de recursos de pós-produção.

    Mustafa Hassona

    Mustafa Hassona


    Mustafa Hassona

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  • Entre Grãos e Pixels

    Livro de Ana Paula Umeda publicado em Kotter Editorial.

    Ana Pala Umeda

    descrição: a foto em preto e branco mostra um homem idoso segurando um casaco enquanto caminha sem ninguém ao seu redor e um prédio espelhado do seu lado direito.  

    São ensaios de luz e sombra sobre a vida e se dividem em três ensaios independentes, mas que se complementam e cada um é acompanhado e potencializado por um ensaio fotográfico igualmente eloquente. O ensaio sobre a ausência é tangenciando pela questão pandêmica e aborda o outro e a política. O segundo fala sobre a humanidade, é o qual a autora volta à clássica pergunta: o que nos faz humanos? O ultimo aborda sobre o fim da fotografia e nos faz refletir se ela estaria mesmo com os dias contados, como às vezes é anunciado. 

    São textos interdisciplinares, escritos em linguagem acessível, mas todos devidamente fundamentados e atravessados pela fotografia. Indicado para todas/os/es apreciadoras/res das humanidades, das artes e de uma boa reflexão.


    Autora

    Local de publicação


    Esta publicação foi elaborada com base nas informações prestadas por Ana Paula Umeda, através do formulário Divulgue suas publicações!. Resposta número 17.

  • O abutre e a menina

    O abutre e a menina

    A foto que evidenciou a fome no Sudão e entrou para a história do fotojornalismo 

    O abutre e a menina é uma fotografia feita por Kevin Carter, em 11 de março de 1993, no Sudão, momento em que o país sofria uma guerra civil e enfrentava sua maior crise humanitária no século XX. A foto, que retrata uma situação de miséria e medo, mostra um abutre olhando para uma criança esquelética.

    Kevin Carter 

    A produção dessa foto foi possível em função de uma ação da Organização das Nações Unidas (ONU) para sensibilizar a opinião pública internacional em relação à situação de penúria da população sudanesa. Para isso, a ONU convidou dois fotojornalistas para integrar a comitiva que foi para o sul do Sudão: Kevin Carter e João Silva.

    O momento em que Kevin registra a foto do abutre e a menina é quando está nesse campo a céu aberto, acompanhando a distribuição de alimentos pelos funcionários da ONU e esperando alguma possibilidade de clique, até que encontra a cena da ave olhando para a criança.

    Foi essa imagem do abutre e a menina que pouco tempo depois foi publicada no jornal The New York Times e replicada em todos os grandes jornais do mundo e fez Carter ganhar grande visibilidade e a fome no Sudão ser vista e a ONU arrecadar doações para o país. Além disso, no ano seguinte, em 1994, o fotógrafo ganhou o prêmio Pulitzer de fotografia.

    Após a publicação dessa foto, Kevin teve sua postura questionada pela opinião pública que queria saber o que aconteceu com a menina e se ele a teria ajudado. Ele conta que espantou o abutre e que sentou e chorou debaixo de uma árvore. Depois também disse que a menina se levantou e caminhou até a clínica médica, onde João Silva estava fotografando. Porém, a opinião pública não ficou satisfeita com essas explicações e indagou porque ele não levou a menina para um lugar seguro.

    Toda essa história gerou um debate sobre a atuação de jornalistas e fotojornalistas em cenários de guerra, se eles deveriam prestar assistência ou apenas seremos observadores. Todos esses questionamentos perturbaram muito Carter, que não soube lidar com a situação, pois já enfrentava uma série de problemas pessoais como depressão, relacionamentos amorosos mal sucedidos, uso abusivo de álcool e outras drogas e endividamento. Assim, no dia 27 de julho de 1994, aos 33 anos, ele levou seu carro até um local de sua infância e cometeu suicídio.

    Uma descoberta importante dessa foto é que apesar de todos acharem que era uma menina na foto, na verdade, era um menino. Uma equipe de jornalistas voltou para a aldeia de Ayod, no Sudão, para reconstruir a história daquela fotografia e tentar descobrir quem era a criança, e nisso, descobriram que era um menino chamado Kong Nyong. Com essa pista, dois dias depois, a equipe chegou à família do menino. O pai confirmou que a criança da foto de Kevin Carter era seu filho e que ele se recuperou da desnutrição e sobreviveu. O pai também disse que Kong morreu já adulto em 2006, devido a uma forte febre.

    Para além de toda história por trás da foto, a relação do abutre e da menina, que parece ser somente de presa e predador, me transmite, de forma subjetiva, uma denúncia da própria ave da situação precária que a criança estava, ou seja, o abutre também tem o papel de evidenciar que aquela criança precisava de ajuda.

    Uma outra perspectiva que me desperta da fotografia é como essa foto feita há 30 anos atrás em um país localizado do outro lado do oceano atlântico remete a situação atual de fome que o Brasil enfrenta, em que o abutre ali presente pode ser representado como o governo atual brasileiro, que não cria soluções para resolver o problema e somente fica observando agravar. Já a criança pode ser representada como os 19,1 milhões de brasileiros já atingidos pela fome, conforme dados da CNN Brasil. A imagem mostra a situação do Sudão naquele momento, mas também faz alusão a outros momentos trágicos que o mundo vive, como a pandemia de COVID-19 que acentuou a fome.

    A foto no meu ver propõe uma reflexão sobre como nós, sociedade, lidamos com as desigualdades que atravessam as pessoas. Seríamos nós abutres que ficam só observando sem tomar qualquer atitude e esperando ¨apodrecer¨ ?  É sobre pensar em humanidade e alteridade.

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    CALIXTO, Vitória. O abutre e a menina. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em: <https://culturafotografica.com.br/o-abutre-e-a-menina/>. Publicado em: 24/11/2021. Acessado em: [informar data].

  • Roger Cipó

    Roger Cipó

    Fotógrafo, pesquisador, candomblecista e militante contra os crimes de intolerância religiosa e racismo.

    Roger Cipó nasceu na periferia de Diadema. É um jovem negro apaixonado pela fotografia e um homem de muita fé, por isso juntou o amor pela religião e pela arte de foto e criou nas redes sociais a plataforma Olhar de um Cipó, em que documenta as religiões de matriz africana.

    Roger Cipó

    Suas produções e pesquisas fotográficas focadas em terreiros de candomblé, tem como objetivo estudar as diversas estruturas que baseiam as sociedades afro religiosas de São Paulo, além de divulgar as belezas e riquezas existentes no cotidiano social, cultural e ritualístico das comunidades. Em seu trabalho, as fotos ultrapassam a condição de documentação e assumem o papel de instrumento sensibilizador, propondo reflexão sobre a verdadeira imagem dos cultos afros para assim, quebrar as barreiras do preconceito de quem não os conhece.

    Roger Cipó

    Roger Cipó
    Roger Cipó
    Roger Cipó

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    CALIXTO, Vitória. Roger Cipó. Cultura Fotográfica (blog). Disponível em: <https://culturafotografica.com.br/roger-cipo/>. Publicado em: 22/11/2021. Acessado em: [informar a data].

  • Boris Kossoy e o método iconográfico / iconológico

    Boris Kossoy e o método iconográfico / iconológico

    Historiador oferece importante contribuição para o reconhecimento dos documentos fotográficos como fontes históricas.
     
    O método iconográfico / iconológico propõe compreender a mentalidade de uma época e lugar com base nas obras de arte produzidas naquele tempo e espaço. Para isso, faz-se necessário a reconstituição do contexto em que a obra ou o conjunto de obras sob análise foi produzida mediante o processamento de um variado grupo de documentos.
     
    Fotografia de três painéis do Atlas Mnemosyne realizado por Aby Warburg. Cada um deles abrange um determinado tema e é composto por diversas reproduções de pinturas e esculturas dispostas lado a lado.
    Fragmento de Atlas Mnemosyne de Aby Warburg. Crédito:  Silke Briel / HKW

     

    Parte-se de uma compreensão do processo artístico como um processo de produção simbólica no qual são expressos os conteúdos inconscientes da cultura. Dela decorre a tese de que os estilos artísticos podem ser tratados como sintomas da mentalidade de uma determinada cultura.
     
    O responsável pela concepção deste método foi o historiador da arte Aby Warburg, cujo principal trabalho, Atlas Mnemosyne, tinha o propósito de reconhecer as cadeias de sobrevivência das imagens simbólicas, que ele chamava de pathosformel (fórmula do pathos), na cultura. Nos últimos anos, sua obra vem recebendo grande destaque a partir do trabalho do filósofo Georges Didi-Huberman.
     
    No entanto, foi Erwin Panofsky, também historiador da arte, o responsável pela sistematização do método. Panofsky destaca que a interpretação de uma obra de arte é um processo composto por três etapas: (1) descrição pré-iconográfica: consiste no reconhecimento de seres, objetos e eventos; (2) análise iconográfica: reconstituição de alegorias, histórias e símbolos; (3) interpretação iconológica: revelação do significado intrínseco da obra, em outras palavras, exposição dos conteúdos inconscientes da mentalidade da época e do lugar em que ela teve origem.
     
    A abordagem de imagens fotográficas por meio do método iconográfico/iconológico encerra uma crítica ao pressuposto realismo das fotografias que promove o apagamento da mediação em favor de um suposto testemunho da cena mostrada. Para os pesquisadores que adotam esta perspectiva teórica e metodológica, as fotografias não são feitas apenas para serem observadas, mas também para serem lidas.
     
    No Brasil, um dos pesquisadores mais reconhecidos pela utilização deste método no estudo de imagens fotográficas é o fotógrafo e historiador Boris Kossoy, cuja obra oferece uma importante contribuição para o reconhecimento dos documentos fotográficos como fontes históricas.
     
    Capas dos livros O Encanto de Narciso: reflexões sobre fotografia, Fotografia & História, Realidades e ficções na trama fotográfica, Os tempos da fotografia: o efêmero e o perpétuo. Todos de autoria do fotógrafo e historiador Boris Kossoy.
    Boris Kossoy / Ateliê Editorial
     
    Em sua obra, Kossoy propõe uma abordagem teórica e metodológica dos documentos fotográficos cuja finalidade é revelar o que está escondido atrás da visibilidade fixada em uma fotografia ou em um conjunto delas. Para isso, ele divide a interpretação das imagens fotográficas em duas etapas: (1) a análise iconográfica, que consiste na decodificação da realidade exterior do registro e (2) a interpretação iconológica, que consiste na compreensão da realidade interior do registro.
     

    O significado mais profundo da vida não é o de ordem material. O significado mais profundo da imagem não se encontra necessariamente explícito. O significado é ima­terial; jamais foi ou virá a ser um assunto visível passível de ser retratado fotograficamente. O vestígio da vida cristalizado na imagem fotográfica passa a ter sentido no momento em que se tenha conhecimento e se compreen­dam os elos da cadeia de fatos ausentes da imagem. (KOSSOY, 2012, P. 130)

     
    O que vemos em uma fotografia é apenas um fragmento de uma história oculta e a espera de ser revelada. Cabe àqueles que se dedicam à interpretação das imagens fotográficas recuperar essas micro-histórias implícitas em seus conteúdos e revivê-las no campo do imaginário.
     
    Esta postagem propõe apresentar a síntese de uma das reflexões elaboradas ao longo do I Ciclo de Debates de nosso Grupo de Estudos, composto por quatro encontros realizados no período entre fevereiro e junho de 2021 e nos quais foram discutidas as seguintes obras, no todo ou em partes:
     
    BARTOLOMEU, Cezar (org.) Dossiê Warburg. Arte & Ensaios, n. 19, Rio de Janeiro, n. 19, p. 118-143, 2009. ISSN:  2448-3338 Disponível em: <https://www.ppgav.eba.ufrj.br/publicacao/arte-ensaios-19/>
    BURKE, Peter. Testemunha ocular: o uso de imagens como evidência histórica. São Paulo: Editora Unesp Digital, 2017.
    KOSSOY, Boris. Fotografia & História. 4ª ed. São Paulo: Ateliê Editorial, 2012.
    KOSSOY, Boris. Realidades e ficções na trama fotográfica. 3ª ed. São Paulo: Ateliê Editorial, 2002.
    MAUAD, Ana Maria. Sobre as imagens na História, um balanço de conceitos e perspectivas. Revista Maracanan, v. 12, n. 14, p. 33 – 48, jan. 2016. ISSN 2359-0092. Disponível em: <https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/maracanan/article/view/20858>.
    MAUAD, Ana Maria. Através da imagem: Fotografia e História – Interfaces. Tempo, v. 1, n. 2, p. 73 – 98, dez. 1996. ISSN 1980-542X . Disponível em: <http://www.historia.uff.br/tempo/artigos_dossie/artg2-4.pdf>.
    MENESES, Ulpiano Bezerra. Fontes visuais, cultura visual, história visual: balanço provisório, propostas cautelares. Revista Brasileira de História, v. 23, n. 45, pp. 11-36, 2003. ISSN 1806-9347. Disponível em: <https://www.scielo.br/j/rbh/a/JL4F7CRWKwXXgMWvNKDfCDc/>
    Abaixo, você poderá assistir as gravações dos debates realizados neste ciclo.
     
     

    #artigos é uma coluna de caráter ensaístico e teórico. Trata-se de uma série de textos dissertativos por meio do qual o autor propõe uma reflexão fundamentada acerca de um ou mais elementos que constituem a cultura fotográfica. Quer conhecer melhor a coluna #artigos? É só seguir este link.

  • O menino do Rio Negro

    Fotografia de Araquém de Alcântara evoca o equilíbrio entre gente e meio ambiente
    Um jovem segura uma cobra em volta de seu pescoço, ao que tudo indica, durante um passeio de canoa no Rio Negro, Amazonas. A cena não só expressa uma beleza única, como também é um portal para entendermos como o fotógrafo responsável pela obra, Araquém de Alcântara, enxerga o mundo. 
    Araquém de Alcântara

    Esse cenário pode ser considerado incomum para muitos que não vivem na região. Em uma visão centrada no sudeste do país, a princípio me peguei estranhando tal comportamento a ponto de considerá-lo perigoso e impróprio. Porém, ao refletir um pouco sobre o personagem presente no registro e as prováveis diferenças culturais que compartilho com ele, comecei a reconhecer que alguns desses sentimentos partiam de minha ignorância.
    Ao contrário de mim, Araquém de Alcântara parece enxergar a beleza desse encontro entre os dois, uma vez que registra o momento como algo singelo e despreocupado, expressando uma das características mais fortes do seu trabalho, mostrar a relação íntima entre seres humanos e o meio ambiente.    
    A forma como o garoto segura o animal, de maneira firme e decidida denota a sua naturalidade com a situação. Não parece temer um ataque da cobra, pelo contrário, tamanha frivolidade ao lidar com a situação denuncia que talvez não seja a primeira vez que vivencia algo do tipo. 
    O preto e branco da imagem existem por conta do caráter documental da obra do fotógrafo. No entanto, esse elemento ajuda a criar um fator harmônico entre os personagens. Esse bom relacionamento entre os dois cria uma sensação de sustentabilidade que é reforçada pela retirada das cores, fazendo com que os dois corpos sejam difíceis de distinguir. 
    Uma das questões que a fotografia levanta é “se é possível viver em paz com animais selvagens”. Afinal, não são todos que reagiriam de maneira tão pacífica quanto aquela cobra. O cenário e momento escolhidos, mostram como esse encontro entre dois moradores da mesma região, só é possível pelos dois personagens serem familiares um com o outro.
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  • Um olhar sobre Araquém de Alcântara

    Entre o povo e a natureza, fotógrafo se dedica a registrar as belezas do Brasil

    Pioneiro na fotografia ambiental brasileira, Araquém de Alcântara Pereira é considerado um dos fotógrafos mais importantes do país. Com mais de 50 anos de carreira, utilizou seu trabalho como forma de protesto em defesa da causa ecológica. 


    Araquém de Alcantara

    O fotógrafo, professor e jornalista nasceu em Florianópolis, no ano de 1951. Durante sua graduação na Universidade de Santos, começou a trabalhar como repórter para o jornal Estado de S. Paulo e para o Jornal da Tarde. Foi após uma cobertura documental do Parque da Juréia, em Iguapé, São Paulo,  que passou a fazer diversas expedições ambientais, especialmente para a Mata Atlântica. 
    Em 1988, publicou a sua primeira obra intitulada “Terra Brasil”, contendo fotografias dos parques nacionais, que se tornou o livro sobre fotografia mais vendido em todos os tempos no país. Também foi o primeiro fotógrafo brasileiro a trabalhar para National Geographic, se consolidando ainda mais como um ícone no cenário brasileiro. 

    Araquém de Alcântara
    Araquém de Alcântara

    Araquém de Alcântara
    Araquém de Alcântara

    Araquém de Alcântara

    Araquém de Alcântara

    Araquém de Alcântara

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